Porque Hoje é Domingo

DO TEXTO:



 



Por: Carlos Alberto Alves
jornalistaalves@bol.com.br

Achei por bem, e porque ainda se respira a quadra natalícia (para mim, todos os dias é Natal), transcrever hoje o texto da autoria do Dr. Álvaro Leal Monjardino “A Verdade Dói”, publicado no matutino terceirense “A União” no passado dia 24 de Dezembro.

Acresce que Álvaro Monjardino é um dos mais consagrados historiadores portugueses e um político que marcou relevante presença em vários debates de fundo. Para além disso, como professor de história (fui seu aluno), demonstrou sempre uma enorme e invulgar capacidade de transmissão, ou seja,a fácil comunicação entre o professor e o aluno. Todos nós tínhamos um enorme respeito por Álvaro Monjardino e era raro faltarmos às suas aulas.

“Neste Natal que ora passa as perspectivas não são animadoras. E parece bem que, apesar das excepções, o comum da gente já assumiu que entrámos num período de privações e, talvez pior ainda, de incertezas quanto a um futuro que nem é só do nosso país, pois tem a ver com a própria União Europeia e, até por via de tudo isso, com o nosso arquipélago e a sua, até agora cómoda para muitos, condição de ultraperiferia.

No entanto, em muito da comunicação social portuguesa abundam vozes de protesto, nem tanto contra as privações presentes e próximas, mas contra quem disse o óbvio, i.e., que muito naturalmente haverá mais portugueses a emigrar. Bem, o facto é isto estar já a acontecer, sem ser preciso – nunca foi! – que o poder público o reconhecesse. É que, historicamente, os portugueses sempre o fizeram, porque desde o tempo de D. Afonso Henriques viveram num país pobre em recursos, tanto naturais como humanos. E sempre dele saíram meramente enxotados pela estreiteza das perspectivas que se lhes abriam. A uns correu bem, a outros mal. Quantos, sobretudo destes últimos, nunca o saberemos. Consigo levaram a sua cultura que – para algum erudito intérprete das raízes do fado («património imaterial da Humanidade», com esforço e subsequente honra do país e da Câmara Municipal de Lisboa, apesar de nem ter dois séculos de existência) – incluiria a aceitação do Destino; e, para outros, a ideia de que a vida é sempre difícil, sendo preciso enfrentar-lhe os maiores escolhos, eventualmente evitando-os, até pela emigração.

Note-se que as vozes mais protestantes são as de quem não se fez ouvir quando o país, ao longo de anos (sim, que vários foram) mergulhava na embriaguez de uma vida próspera sem alicerces reais. Mas sabia bem. Só que não era verdade. E a Verdade dói.

É neste contexto que abordamos os dias do Natal. Valham-nos eles para pensarmos um pouco, agora com orçamentos curtos e muitas veleidades a esbaterem-se. E pensarmos não nos encantos do Presépio e dos sucessivos adereços que se lhe foram inventando, mas na pobreza original dele e na do Homem-Deus que há 21 séculos nasceu num estábulo («presépio» é isso mesmo, um estábulo), e ainda – já então! – no meio da indiferença de gente que, no caso, havia corrido a recensear-se por ordem do imperador de Roma. Um imperador, ademais, estrangeiro, pagão e temido – à falta de ser benquisto, que nunca poderia sê-lo do altivo povo de Abraão, Isaac e Jacob…

Eis por que talvez estejamos, neste Natal, mais próximos do verdadeiro”.

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