Mostra sobre José Saramago põe obra à margem do homem

DO TEXTO:
José Saramago
KÁTIA LESSA
SÃO PAULO
Foi ao surpreender-se pela dimensão humana de José Saramago que o curador Marcello Dantas resolveu organizar a exposição "Os Pontos e a Vista", inaugurada hoje, com entrada gratuita, no Farol Santander, ex-Banespão, na região central da cidade.
O objetivo da exibição é mostrar mais do homem do que da obra e revelar características marcantes do autor português, como o humor, a capacidade de observar, de se reinventar, de amar, de organizar o mundo e de, incansavelmente, se deslocar.
O tratamento da exposição segue uma linha peculiar. Ela é formada por 15 estações demarcadas por linhas no chão e divididas em dois andares.
Em cada estação há um objeto que se relaciona com um pequeno filme: eles são projetados dentro de malas, em janelas, sobre montes de areia ou telas convencionais.
A cada parada, o visitante desenvolve um momento de intimidade com o autor e descobre algum aspecto da personalidade de um homem que, antes de ser o primeiro autor em língua portuguesa a ganhar um Nobel, foi serralheiro, mecânico, agricultor, jornalista, entre outras coisas.
Os filmes são trechos editados do acervo do diretor Miguel Gonçalves Mendes, que conviveu por cinco anos com o escritor para criar o filme "José e Pilar".
"Quando descobri o volume desse material, achei o direcionamento da exposição. Um escritor deixa como legado sua obra, não coisas materiais. Portanto, e já que ele era um homem muito espartano, que não gostava de acumular coisas, mantive essa economia ao planejar a montagem", diz Dantas.
Entre os poucos objetos exibidos estarão os óculos de grau originais, o computador no qual escreveu seus livros, o Nobel emoldurado e a cama na qual Saramago dormia com os porcos aos seis anos de idade na casa dos avós, na cidade de Azinhaga.

Miopia
O nome da exposição, "Os Pontos e a Vista", pretende explorar três aspectos. Primeiro, lembra um homem que trabalhava a mecânica da língua e chegou a escrever um livro todo sem pontos.
Depois, destaca a perspectiva de um homem que fisicamente sempre teve que se adaptar —era muito alto e míope— e explorou o tema da visão em obras como "O Ensaio Sobre a Cegueira".
E, terceiro, o trânsito de um homem que morou em diversas cidades e pôde ver o mundo de ângulos diferentes.
"Os Pontos e a Vista" não se preocupa com a biografia.
Seja ao ouvir a voz de Saramago dentro de uma instalação que é um táxi, como se o visitante estivesse viajando com ele, ou ao deparar-se com vídeos desfocados, simulação das dificuldades de ser míope, revela-se na mostra um homem grandioso como ele e comum como todos nós.
"É muito inspirador para qualquer pessoa saber que Saramago publicou seu primeiro romance aos quase 60 anos de idade e que achou o amor de sua vida aos 65. Ao entrar em contato com um homem capaz disso tudo, ninguém sai ileso."
Peça da exposição que homenageia José Saramago no Farol Santander - Luccas Vilela

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