Roberto Carlos chega aos 70 seduzindo público jovem que o esnobou

DO TEXTO:

O cantor e compositor Roberto Carlos, que chega aos 70 anos
seduzindo público jovem, em foto tirada em 1983


Marcus Preto
de São Paulo

Na próxima terça-feira, Roberto Carlos faz 70 anos. E ninguém escapa dele. Esteja você onde estiver, vai ser lembrado disso em algum momento do seu dia --pelo rádio, pela TV, pelos jornais, pelo zunzunzum na rua.

O Brasil chama Roberto de Rei desde os anos 1960. 

O artista se mantém desde então como o maior vendedor de discos do país. Lota os shows que faz. E, mesmo que não lance um álbum de inéditas há oito anos, é reconhecido como um dos nossos autores mais relevantes. 

Gerações que passaram a ouvi-lo depois dos anos 1990 --e seus shows são cheios de adolescentes-- devem imaginar que esse prestígio se manteve intacto durante todo esse tempo. Não podem imaginar que, por cerca de dez anos, Roberto Carlos não seduziu a juventude. 

O estranhamento com a faixa etária que o alçou à fama começou por volta de 1982, segundo Paulo César de Araújo, autor de "Roberto Carlos em Detalhes", biografia vetada pelo Rei na Justiça. 

Quando o rock Brasil começa a despontar --com bandas como Blitz, RPM, Titãs, Legião Urbana, Ira! e Barão Vermelho--, o discurso de Roberto foi "encaretando". 

"O mesmo artista que já havia cantado que 'tudo o que eu gosto é ilegal, é imoral ou engorda' [em 1976] passava a representar o contrário disso", diz Araújo. 

Quem assumia essa postura era Cazuza, por exemplo. "Mais uma dose? É claro que eu tô a fim", cantava. 

Alguma coisa na receita infalível do Rei tinha dado errado, e o público jovem mais antenado se afastou. Roberto não voltaria a se aproximar dele se dependesse só de um impulso artístico seu. Mas a obra trabalhou por ele. 

"As pessoas passaram a não se preocupar com o que o Roberto estava fazendo, mas com o que tinha feito no passado", diz o ex-Ira! Edgard Scandurra. "Aquela obra fantástica dos 60 e 70 não podia ser menosprezada." 

Fernando Santos/Folhapress

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CARACÓIS

O apelo do Rei entre os jovens começa a retornar em 1992. No show "Circuladô", Caetano Veloso revelava que "Debaixo dos Caracóis dos seus Cabelos" (1971) fora composta para ele quando estava exilado em Londres.
"Ali, o público vê que Roberto tinha tomado uma atitude política que jamais imaginavam", diz Araújo. 

A gravação de "Caracóis" foi para a rádio e colocou a música, então semiesquecida, nas paradas de sucesso. 

Mais sucesso ainda faria, no ano seguinte, "As Canções que Você Fez pra Mim" --o álbum inteiro que Bethânia dedicaria às composições de Roberto (e Erasmo). 

Mesmo quem insistia em chamar Roberto de brega foi obrigado a assumir suas qualidades como compositor. 

Os passos seguintes foram dados por alguns daqueles mesmos artistas que o encobriram na década anterior. 

Lançado em 1994, o álbum-tributo "Rei" trazia justamente Barão, Blitz, Kid Abelha e Paulo Miklos (dos Titãs). "É Proibido Fumar", com Skank, vira hit. De novo. 

Segundo Miklos, nenhum dos envolvidos no CD tinha em mente "resgatar" Roberto --até porque ele vendia mais que qualquer roqueiro. 

"Queríamos explicitar a influência dele, a importância da música nos primórdios do rock que fazíamos." 

Com os Titãs, Miklos voltaria a contribuir com o retorno de Roberto à juventude em 1998, quando a banda pinçou do baú a filosófica "É Preciso Saber Viver". Uma das mais tocadas do ano, voltou ao repertório do Rei. 

Canções de Roberto entrariam em discos do Jota Quest, do Kid Abelha, de Sandy & Junior e de Luiza Possi. 

Seus shows atuais recebem muitos dos mesmos espectadores que o negaram nos 1980. Hoje trintões, choram de emoção quando o Rei surge no palco e canta. 

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Ruptura nos 80 foi necessária, mas ele sempre esteve no topo

PAULO RICARDO
ESPECIAL PARA A FOLHA

"Havia alguma coisa errada com o rei." Nesse verso de "Rádio Pirata", meu inconsciente manifestava a ruptura com o establishment que nossa geração buscava.

Quase sem querer, a figura do Rei caiu como luva. Eu, súdito leal de Roberto 1º, precisava matar meu pai, negar minhas origens, para dar o passo que o momento exigia.

Roberto Carlos foi minha primeira grande influência.

Aos cinco anos, já cantava suas canções em programas de TV da época. Mimetizava cada verso, melodia e trejeito. Vestia calças Calhambeque e colecionava memorabilia da Jovem Guarda.

Vi seu primeiro show aos cinco, na inauguração do supermercado Casas da Banha, na Tijuca. Meu pai me pôs no palco, mas os adultos foram mais rápidos e me perdi, acabei indo para casa sozinho...

Em 1985, o conheci numa festa da Rádio Tupi. Muitas emoções. O carisma de Roberto é letal. Confesso que fiquei preocupado com a possibilidade de ele ter ouvido "Rádio Pirata" e notado alguma provocação. Não creio que o tenha feito.

Mas, naquele momento, artisticamente, havia sim alguma coisa errada com o Rei.

Desde os 11 anos mergulhado na beatlemania e no rock, afastei-me de Cachoeiro do Itapemirim.

Londres era o objetivo, e o Roberto dos botões da blusa, dos caminhoneiros, dos taxistas e das gordinhas de óculos ficava para trás.

Em 1991, o diretor Aloísio Legey me ligou para participar de um "Globo Repórter".

Disse que ele havia me escolhido como seu cantor favorito e queria que eu regravasse "Detalhes". Quase morri.

Hoje, me reconciliei com meu "pai", com minhas influências, e, aos 70 anos, Roberto está onde sempre esteve, no topo.

PAULO RICARDO é cantor, compositor, vocalista e baixista da banda RPM.

17-04-2011

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Matéria enviada por Carmen Augusta, representante do Splish Splash em Sorocaba-SP - Brasil.
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