No encontro com Preste João: fé, poder e os mistérios da Etiópia do século XVI
"...e vi que às vezes mais se perde com cristãos que com gentios." — Fernão Mendes Pinto, Peregrinação
NOTAS DE BORDO Local:Etiópia (interior do Corno de África) Evento-chave: Visita à corte do lendário Preste João Ano estimado: 1540 (aproximadamente) Ação: Missão de observação e contactos diplomáticos Estado: Impressionado, mas confrontado com os limites da fé ocidental
"O que era lenda tornou-se lição: Fernão encontrou um rei — e perdeu certezas." Vímara Porto
Por: Armindo Guimarães
Durante anos ouvira falar do lendário Preste João — monarca cristão de uma terra remota onde o ouro brotava do chão, os leões dormiam com os homens, e os milagres faziam parte da administração. Muitos diziam tratar-se de fantasia. Fernão, não. E um dia, guiado por contactos portugueses na costa oriental de África, viu-se a caminho do coração da Etiópia.
A travessia não foi fácil. Montanhas, desertos, rios infestados de crocodilos, dialectos que ninguém entendia, e os riscos diplomáticos de se aparecer à porta de um rei quase lendário. Mas chegou. E o que encontrou não foi o paraíso, nem o reino dos céus — mas um povo digno, um soberano orgulhoso, e uma fé que se exprimia à sua maneira: entre o cristianismo ortodoxo, ritos ancestrais e um profundo sentido de identidade.
A chegada ao reino foi como entrar num tempo paralelo. As muralhas não eram apenas de pedra — eram de história, de orgulho, de resistência. Fernão, habituado a medir o mundo pela régua europeia, viu-se diante de uma civilização que não pedia aprovação nem tradução.
Os rituais eram solenes, os olhares atentos. Cada gesto do rei parecia carregar séculos de sabedoria. E ali, entre incenso e silêncio, Fernão compreendeu que o verdadeiro encontro não se faz com mapas, mas com humildade.
Fernão foi recebido com cerimónias, com cautela e com curiosidade. Falou da Europa, dos mares, do Papa. E ouviu perguntas difíceis: por que os cristãos da Europa vinham com armas? Por que cobravam tributo com a cruz numa mão e a espada na outra?
Nesse lugar onde fé e política eram inseparáveis, Fernão sentiu-se pequeno. Não porque fosse português, mas porque percebia que não era o centro do mundo — apenas mais um ponto no seu vasto mapa.
“Não vim ensinar,” escreveu ele. “Vim aprender o que não sabia que existia.”
DIÁRIO DE FERNÃO Excerto imaginário inspirado na Peregrinação
Diziam que o Preste João era uma lenda. Mas o que vi foi um rei de carne e alma.
Falava pouco, mas pesava cada palavra.
Quando lhe disse que vinha de longe, sorriu e perguntou: "Mas vieste para dar ou para tomar?"
Ali percebi que fé sem justiça é só mais uma bandeira.
CURIOSIDADE HISTÓRICA
Durante séculos, o Preste João foi uma figura lendária no imaginário europeu — um rei cristão oculto algures na Ásia ou África.
No século XVI, muitos portugueses acreditavam que ele reinava na Etiópia, e várias missões diplomáticas foram enviadas para confirmar essa teoria.
O reino existia mesmo, mas o Preste João era na verdade um título associado aos soberanos da Etiópia cristã — profundamente independentes e muitas vezes desconfiados da intromissão europeia.
NOTA FINAL DO ESCRIBA
Gostou da viagem?
Deixe o seu comentário, partilhe este episódio e convide outros navegadores curiosos a embarcarem nesta aventura.
No encontro com Preste João: fé, poder e os mistérios da Etiópia do século XVI
— Fernão Mendes Pinto, Peregrinação
NOTAS DE BORDO
Local: Etiópia (interior do Corno de África)
Evento-chave: Visita à corte do lendário Preste João
Ano estimado: 1540 (aproximadamente)
Ação: Missão de observação e contactos diplomáticos
Estado: Impressionado, mas confrontado com os limites da fé ocidental
Vímara Porto
A travessia não foi fácil. Montanhas, desertos, rios infestados de crocodilos, dialectos que ninguém entendia, e os riscos diplomáticos de se aparecer à porta de um rei quase lendário. Mas chegou. E o que encontrou não foi o paraíso, nem o reino dos céus — mas um povo digno, um soberano orgulhoso, e uma fé que se exprimia à sua maneira: entre o cristianismo ortodoxo, ritos ancestrais e um profundo sentido de identidade.
A chegada ao reino foi como entrar num tempo paralelo. As muralhas não eram apenas de pedra — eram de história, de orgulho, de resistência. Fernão, habituado a medir o mundo pela régua europeia, viu-se diante de uma civilização que não pedia aprovação nem tradução.
Os rituais eram solenes, os olhares atentos. Cada gesto do rei parecia carregar séculos de sabedoria. E ali, entre incenso e silêncio, Fernão compreendeu que o verdadeiro encontro não se faz com mapas, mas com humildade.
Fernão foi recebido com cerimónias, com cautela e com curiosidade. Falou da Europa, dos mares, do Papa. E ouviu perguntas difíceis: por que os cristãos da Europa vinham com armas? Por que cobravam tributo com a cruz numa mão e a espada na outra?
Nesse lugar onde fé e política eram inseparáveis, Fernão sentiu-se pequeno. Não porque fosse português, mas porque percebia que não era o centro do mundo — apenas mais um ponto no seu vasto mapa.
“Não vim ensinar,” escreveu ele. “Vim aprender o que não sabia que existia.”
DIÁRIO DE FERNÃO
Excerto imaginário inspirado na Peregrinação
Diziam que o Preste João era uma lenda. Mas o que vi foi um rei de carne e alma.
Falava pouco, mas pesava cada palavra.
Quando lhe disse que vinha de longe, sorriu e perguntou: "Mas vieste para dar ou para tomar?"
Ali percebi que fé sem justiça é só mais uma bandeira.
CURIOSIDADE HISTÓRICA
Durante séculos, o Preste João foi uma figura lendária no imaginário europeu — um rei cristão oculto algures na Ásia ou África.
No século XVI, muitos portugueses acreditavam que ele reinava na Etiópia, e várias missões diplomáticas foram enviadas para confirmar essa teoria.
O reino existia mesmo, mas o Preste João era na verdade um título associado aos soberanos da Etiópia cristã — profundamente independentes e muitas vezes desconfiados da intromissão europeia.
NOTA FINAL DO ESCRIBA
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