Às vezes, um livro lido na juventude permanece na memória como se estivesse apenas à espera do momento certo para voltar.
E volta, não como ficção… mas como eco da realidade.
Foi o que me aconteceu com A Última Fome, de John Christopher — uma distopia silenciosa que, anos depois, se cruzou com uma pandemia real.
Este texto é um reencontro entre aquilo que lemos… e aquilo que vivemos.
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A Última Fome — Quando a Ficção Científica se Torna Quase Real
Um vírus com nome chinês, um planeta à beira do colapso… e uma estranha familiaridade com o que já vivemos.
"Hoje em dia, o difícil é sabermos destrinçar entre a realidade e a ficção." Vimara Porto
Por: Armindo Guimarães
Desde a juventude que me deixo levar pela ficção científica — essa espécie de espelho do futuro onde se misturam avisos, exageros e profecias encapotadas. A coleção da Europa-América foi, para mim, uma porta aberta para mundos (e medos) que ainda hoje ecoam. Entre Heinlein, Silverberg, Le Guin e Dick, houve um livro que nunca me largou: No Blade of Grass, de John Christopher, de 1956.
Publicada em Portugal em 1985, sob o título "A Última Fome", esta obra já tinha sido lançada no Brasil, em 1980, com o título curioso e premonitório: "Chung-Li: A Agonia do Verde". E curiosamente, esse nome — que designa o vírus no enredo — faz soar os sinos da coincidência. Chung-Li é um vírus que surge na China e rapidamente mergulha o planeta num colapso sem precedentes. Soa familiar?
Durante a pandemia da COVID-19, dei por mim a recordar este livro como se fosse uma espécie de manual de antecipação. A escassez, o medo, o colapso da ordem social, a urgência de sobrevivência e o recuo civilizacional — tudo isso está lá, nas páginas de um livro que, há mais de 60 anos, parecia apenas ficção. Mas hoje? Hoje talvez o seja menos.
É nestes momentos que percebemos que, por vezes, o mais assustador não é a ficção imitar a vida.
É a vida começar a imitar a ficção.
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Entre Futuros Inventados e Pandemias Reais
Quando a ficção avisou… e ninguém quis ouvir.
Em abril de 2020, no auge da pandemia, publiquei um texto a que dei o título "COVID-19 - A pandemia surgiu sem aviso ou nós já sabíamos tudo?", tentando separar o medo legítimo do sensacionalismo oportunista. Nele cruzo ficções e realidades, desmistifico interpretações forçadas e deixo algumas reflexões sobre o que a História (e a literatura) sempre nos disseram — mesmo quando ninguém quis ouvir.
Falo do livro "The Eyes of Darkness", de Dean Koontz, que muitos apontaram como profecia, quando não passava de coincidência editorial. Refiro também o citado "No Blade of Grass", de John Christopher, e a obra "Condenados a Repetir a História", versão portuguesa de "Doomed to Repeat" de Bill Fawcett, de 2013. E junto a tudo isso, o vídeo de Bill Gates, gravado em 2015, com o aviso claro: “A próxima epidemia? Não estamos preparados.”
De destacar ainda que, mesmo fora do rótulo da ficção científica, há autores contemporâneos que utilizam a ficção como espelho e farol.
José Rodrigues dos Santos, por exemplo, tem criado romances intensamente ancorados em factos científicos, históricos e geopolíticos — por vezes, mais esclarecedores do que relatórios oficiais ou manchetes sensacionalistas.
Livros como A Fórmula de Deus, O Sétimo Selo ou Imortal abordam temas como física quântica, alterações climáticas, inteligência artificial ou a busca pela imortalidade, entrelaçando enredo e realidade com mestria.
É ficção, sim — mas daquelas que nos ajudam a compreender o mundo.
E, por vezes, a antecipá-lo. Porque nem sempre o futuro se esconde em planetas distantes... às vezes, está no parágrafo seguinte.
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Ficção e Realidade – Quando o Futuro Já Estava Escrito
Hoje, com alguma distância, continuo a perguntar: será que aprendemos alguma coisa?
Talvez devêssemos olhar mais vezes para os livros de ficção científica como aquilo que realmente são: não meros exercícios de imaginação, mas tentativas — por vezes visionárias — de nos preparar para o que aí vem.
E se houver uma próxima vez… talvez já ninguém diga que foi sem aviso.
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"Não se pode matar uma ideia." Ray Bradbury
Epílogo
A boa ficção — e especialmente a científica — pode não salvar o mundo, mas pode preparar-nos para ele.
E acredito, com todas as letras, que um bom livro — seja hoje, ontem ou amanhã —pode fazer mais do que muitos discursos... e incomparavelmente mais do que muitos comícios.
Porque enquanto os aplausos se apagam, as páginas certas continuam a murmurar verdades incómodas.
E às vezes, é nelas que o futuro se revela — discretamente, mas sem falhar o alvo.
Às vezes, um livro lido na juventude permanece na memória como se estivesse apenas à espera do momento certo para voltar.
E volta, não como ficção… mas como eco da realidade.
Foi o que me aconteceu com A Última Fome, de John Christopher — uma distopia silenciosa que, anos depois, se cruzou com uma pandemia real.
Este texto é um reencontro entre aquilo que lemos… e aquilo que vivemos.
A Última Fome — Quando a Ficção Científica se Torna Quase Real
Vimara Porto
Por: Armindo Guimarães
Publicada em Portugal em 1985, sob o título "A Última Fome", esta obra já tinha sido lançada no Brasil, em 1980, com o título curioso e premonitório: "Chung-Li: A Agonia do Verde". E curiosamente, esse nome — que designa o vírus no enredo — faz soar os sinos da coincidência. Chung-Li é um vírus que surge na China e rapidamente mergulha o planeta num colapso sem precedentes. Soa familiar?
Durante a pandemia da COVID-19, dei por mim a recordar este livro como se fosse uma espécie de manual de antecipação. A escassez, o medo, o colapso da ordem social, a urgência de sobrevivência e o recuo civilizacional — tudo isso está lá, nas páginas de um livro que, há mais de 60 anos, parecia apenas ficção. Mas hoje? Hoje talvez o seja menos.
É nestes momentos que percebemos que, por vezes, o mais assustador não é a ficção imitar a vida.
É a vida começar a imitar a ficção.
Quando a ficção avisou… e ninguém quis ouvir.
Em abril de 2020, no auge da pandemia, publiquei um texto a que dei o título "COVID-19 - A pandemia surgiu sem aviso ou nós já sabíamos tudo?", tentando separar o medo legítimo do sensacionalismo oportunista. Nele cruzo ficções e realidades, desmistifico interpretações forçadas e deixo algumas reflexões sobre o que a História (e a literatura) sempre nos disseram — mesmo quando ninguém quis ouvir.
Falo do livro "The Eyes of Darkness", de Dean Koontz, que muitos apontaram como profecia, quando não passava de coincidência editorial. Refiro também o citado "No Blade of Grass", de John Christopher, e a obra "Condenados a Repetir a História", versão portuguesa de "Doomed to Repeat" de Bill Fawcett, de 2013. E junto a tudo isso, o vídeo de Bill Gates, gravado em 2015, com o aviso claro: “A próxima epidemia? Não estamos preparados.”
De destacar ainda que, mesmo fora do rótulo da ficção científica, há autores contemporâneos que utilizam a ficção como espelho e farol.
José Rodrigues dos Santos, por exemplo, tem criado romances intensamente ancorados em factos científicos, históricos e geopolíticos — por vezes, mais esclarecedores do que relatórios oficiais ou manchetes sensacionalistas.
Livros como A Fórmula de Deus, O Sétimo Selo ou Imortal abordam temas como física quântica, alterações climáticas, inteligência artificial ou a busca pela imortalidade, entrelaçando enredo e realidade com mestria.
É ficção, sim — mas daquelas que nos ajudam a compreender o mundo.
E, por vezes, a antecipá-lo. Porque nem sempre o futuro se esconde em planetas distantes... às vezes, está no parágrafo seguinte.
Hoje, com alguma distância, continuo a perguntar: será que aprendemos alguma coisa?
Talvez devêssemos olhar mais vezes para os livros de ficção científica como aquilo que realmente são: não meros exercícios de imaginação, mas tentativas — por vezes visionárias — de nos preparar para o que aí vem.
E se houver uma próxima vez… talvez já ninguém diga que foi sem aviso.
Ray Bradbury
E acredito, com todas as letras, que um bom livro — seja hoje, ontem ou amanhã —pode fazer mais do que muitos discursos... e incomparavelmente mais do que muitos comícios.
Porque enquanto os aplausos se apagam, as páginas certas continuam a murmurar verdades incómodas.
E às vezes, é nelas que o futuro se revela — discretamente, mas sem falhar o alvo.
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