Observatório Nacional ouve relatos de representantes do Movimento dos Atingidos por Barragens

DO TEXTO:

“Nossos direitos estão fragmentados”. A frase é de Joceli Andrioli, representante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). Ele e a advogada popular Anna Carolina Murata falaram em nome da organização, nessa terça-feira, 4 de junho, a integrantes do Observatório Nacional sobre Questões Ambientais, Econômicas e Sociais de Alta Complexidade e Grande Impacto e Repercussão, em reunião realizada na sede da Procuradoria-Geral da República, em Brasília.

Joceli Andrioli disse estar esperançoso com o trabalho do Observatório Nacional, mas demonstrou preocupação com a inexistência de uma política específica que regule os direitos dos atingidos por barragens. “Em Brumadinho, toda a população foi considerada atingida e isso é um marco histórico. Mas, no crime da Bacia do Rio Doce, em Mariana, houve a negativa dos nossos direitos pela Fundação Renova, que nega o MAB como ator social”, falou. A Fundação Renova, criada pelas empresas Vale e BHP, é a entidade responsável por mobilizar a reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana. Porém, para Joceli Andrioli, “o Estado deveria assumir o processo de gestão. Não se pode permitir a coordenação pelas mãos das empresas que cometeram o crime”.

Anna Carolina Murata reforçou o discurso de Joseli ao defender que os atingidos se incorporem também ao processo decisório de reparação. “As três partes devem estar envolvidas: Estado, empresas e sociedade civil, cada qual com a sua responsabilidade. Não é possível falar em quitação total diante da complexidade dos fatos, mas podemos cobrar mais efetividade da tutela jurisdicional por parte do Estado, que pode proporcionar satisfação e melhoria de vida às pessoas”, disse.

Por sua vez, a presidente do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e procuradora-geral da República, Raquel Dodge, responsável por conduzir a reunião, classificou como bastante abrangente a apresentação do MAB e afirmou que, ao ouvi-los, assim como foi feito com familiares das vítimas da Boate Kiss, ajuda a estruturar a atuação do Observatório Nacional. “Realço o esforço que temos feito para priorizar casos complexos que têm resolutividade baixa, a busca pela transparência do Sistema de Justiça para que entendamos como fazê-lo funcionar melhor e a nossa intenção de chegar às soluções justas”, salientou.

Raquel Dodge também pediu ao MAB que apresente ao Observatório Nacional uma definição conceitual do termo atingido, a fim de compreender como a organização enxerga a questão.Por fim, a presidente do CNMP destacou que os órgãos do Sistema de Justiça devem trabalhar unidos e pautados pela lealdade, sobretudo, com as vítimas. “Se estivermos juntos, ainda com os Poderes Executivo e Judiciário, e leais à verdade e à Justiça, tudo se resolve mais rápido. Não podemos tolerar estratégia que adia os pagamentos e dissimula responsabilidade”, salientou.

Outras manifestações

A conselheira do CNJ Maria Tereza Uille disse que vê o MAB como um movimento extremamente representativo e destacou aos presentes a atitude pioneira do Observatório Nacional de apresentar em um portal os números de todos os processos relativos aos casos acompanhados pelo grupo, o que é, segundo ela, um grande avanço em transparência. Ainda de acordo com Maria Tereza, “três itens pautam nosso trabalho: dar visibilidade às vítimas, acompanhar a razoável duração dos processos de forma estratégica e consolidar as informações das áreas de Comunicação de diversos órgãos do Sistema de Justiça”. A conselheira propôs, ainda, a criação de um quadro de acompanhamento do pagamento de indenizações aos familiares das 19 pessoas que morreram na tragédia de Mariana.

Por sua vez, o secretário de Relações Institucionais do CNMP e membro do Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MP/MG), Nedens Ulisses, reconheceu o trabalho realizado pelo MAB com dedicação diária e de grande relevância social. Além disso, destacou que o acompanhamento processual feito pelo Observatório Nacional já fez alguns processos andarem, até mesmo com decisões tomadas, e ressaltou que, ao lidar com a tragédia de Brumadinho, houve de imediato um alinhamento institucional entre diversos órgãos, com muito trabalho e empenho desde o primeiro dia.

Também membro do MP/MG, o promotor de Justiça Andre Prado, coordenador de Inclusão e Mobilizações Sociais da instituição, disse que os processos das duas cidades de Minas Gerais vitimadas por rompimento de barragens foram conduzidos de formas diferentes. “Em Brumadinho, desde o início, colocamos na mesa todos os atingidos para discutirem conosco, o que propiciou um controle social maior. Infelizmente, em Mariana, não foi assim”, falou. Ele ainda fez um apelo para que tanto CNMP quanto CNJ editem resoluções que tragam parâmetros de atuação em casos complexos e de grande impacto.

Já o assessor especial da Secretaria de Governo da Presidência da República, Paulo Bernardo dos Santos, representando o ministro Santos Cruz, disse que o órgão, junto à Casa Civil, estuda a possibilidade de elaborar uma política assistencial específica para os atingidos de Mariana e de Brumadinho. Além disso, segundo ele, “é necessário que haja uma classificação precisa sobre cada vítima dessas tragédias, para que os juízes tenham a noção exata de como definir o caráter reparatório no momento da tutela”.

Também estiveram na reunião representando o CNMP a secretária-geral, Cristina Melo; o membro auxiliar da Presidência, Luis Marcelo Mafra; e o membro auxiliar da Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais, Mauricio Andreiuolo. Além deles, participaram o defensor público-geral federal, Gabriel Oliveira; o advogado-geral da União substituto, Renato França; a juíza auxiliar do CNJ Flávia Moreira; e os representantes da Agência Nacional de Águas e da Agência Nacional de Mineração, respectivamente, Marcos Neves e Maurícyo Andrade.

POSTS RELACIONADOS:
Enviar um comentário

Comentários