A poluição pode realmente aumentar o risco de câncer de pulmão em pacientes que nunca fumaram?

Em um estudo dos EUA com 12.000 pacientes com câncer de pulmão, a parcela de pessoas que não fumavam aumentou de 8 para 15% ao longo de vinte anos.
 Criação IA com 2 homens, um deles com uma máscara eum pulmão na mão e o outro a observá-lo, tapando a boca com a mão.

A poluição do ar é o novo tabaco


O tabagismo é um dos principais responsáveis pelo câncer de pulmão, mas alguns estudos recentes começam a notar que a piora da poluição do ar globalmente está fazendo com que as taxas de câncer de pulmão aumentem em todos os lugares, mesmo em não fumantes

São Paulo – fevereiro 2025 - A associação é quase direta: câncer de pulmão e tabagismo. Não é difícil entender o porquê: o cigarro possui mais de 50 elementos carcinogênicos, ou seja, que podem ajudar no desenvolvimento do câncer. Mas, a cada ano, com o aumento na concentração de poluentes na atmosfera, muitos estudos começam a observar que cresce o número de casos de pacientes com tumores no pulmão que jamais experimentaram cigarro – e que também não são fumantes passivos. “Atualmente, sabemos que o ar que respiramos, principalmente nas grandes cidades, apresenta diversos poluentes, que são substâncias que podem estar relacionadas ao aumento da susceptibilidade de desenvolver o câncer, especialmente o de pulmão. Substâncias nocivas da atmosfera oriundas das fábricas, carros, aviões podem danificar as células do nosso organismo e gerar um tumor maligno", explica o Dr. Ramon Andrade de Mello*, oncologista de São Paulo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Cancerologia, Pós-Doutor clínico no Royal Marsden NHS Foundation Trust (Inglaterra) e pesquisador honorário da Universidade de Oxford (Inglaterra).

Em um estudo dos EUA com 12.000 pacientes com câncer de pulmão, a parcela de pessoas que não fumavam aumentou de 8 para 15% ao longo de vinte anos. Um estudo britânico encontrou resultados semelhantes, com sua coorte de nunca fumantes saltando de 13% para 28% em seis anos. Embora essas tendências sejam multifatoriais, uma das principais razões é a poluição do ar, de acordo com a Associação Internacional para o Estudo do Câncer de Pulmão. “A poluição do ar é o novo tabaco. Mas, diferentemente do cigarro, que exige força de vontade para parar de fumar, não inalar ar poluído é uma tarefa difícil”, diz o Dr. Ramon. Um dos maiores culpados é o PM 2.5, material particulado com 2,5 mícrons de tamanho, ou cerca de trinta vezes menor que um fio de cabelo humano. “Assim como a fumaça do cigarro, essas minúsculas partículas de poluição são sugadas profundamente para dentro dos pulmões, danificando o DNA dentro das células e aumentando o risco de câncer”, diz o médico. “O PM 2.5 incita uma descarga de células imunes nos pulmões, e a inflamação resultante ‘desperta’ a mutação do gene do receptor de crescimento epidérmico (EGFR), desencadeando um crescimento celular incontrolável”, completa o oncologista de São Paulo.  

O câncer de pulmão em não fumantes tem características diferentes, pode não ter um ponto definido (como no caso dos associados ao cigarro) e ser mais “nebuloso”. “É como se o câncer do fumante fosse uma bolinha preta no saco de bolinhas brancas, mas o câncer de não fumante é como colocar areia preta nesse saco. Isso impacta o tratamento”, diz o oncologista. Como não há terminações nervosas nos pulmões, não é incomum que o câncer de pulmão apresente ausência total de sintomas. “Alguns pacientes podem sentir aperto no peito e tosse. E, nesse caso, dependendo do local que vivem, é indicado que seus familiares também façam um rastreio, pois podem ser assintomáticos”, diz o médico. “O exame de rastreamento mais utilizado é a tomografia computadorizada de baixa dose de radiação (TCBD). A TCBD é um procedimento rápido, que não exige preparo e não utiliza contraste”, explica o oncologista de São Paulo.

Por fim, o médico destaca que a melhor maneira de se proteger é evitar locais com grande quantidade de poluentes e, quando isso não for possível, usar máscaras pode ajudar, principalmente nas grandes cidades.

*DR. RAMON ANDRADE DE MELLO: Médico oncologista em São Paulo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Cancerologia, Pós-Doutor clínico no Royal Marsden NHS Foundation Trust (Inglaterra), pesquisador honorário da Universidade de Oxford (Inglaterra), pesquisador sênior do CNPQ (Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico), Brasil, vice-líder do programa de Mestrado em Oncologia da Universidade de Buckingham (Inglaterra), Doutor (PhD) em Oncologia Molecular pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (Portugal). Tem MBA em gestão de clínicas, hospitais e indústrias da saúde pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), São Paulo. É pesquisador e professor do Doutorado da Universidade Nove de Julho (UNINOVE), de São Paulo. Membro do Conselho Consultivo da European School of Oncology (ESO). O oncologista tem mais de 122 artigos científicos publicados, é editor de 4 livros de Oncologia, entre eles o Medical Oncology Compendium, Elsevier, de 2024. É membro do corpo clínico do Hospital Israelita Albert Einstein, Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo, e do Centro de Diagnóstico da Unimed, em Bauru, SP. Instagram: @dr.ramondemello
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