Um olhar humorístico para os grandes enigmas da humanidade

DO TEXTO: Os contos do livro apresentam um narrador onisciente. No caso de Sincronicidades, o narrador se coloca como um admirador do Dr. Raul Reis...
 Autor Bert Jr. e capa do livro “Fict-Essays e Contos Mais Leves”.


Conversando com o escritor Bert Jr. sobre “Fict-Essays e Contos Mais Leves”



“Fict-Essays e Contos Mais Leves” (Editora Labrador, 192 pág.) é uma coletânea de sete contos que exploram uma variedade de temas contemporâneos, desde a busca pela saúde perfeita até indagações sobre a origem da vida e do universo. Com sua escrita dinâmica e direta, o escritor gaúcho Bert Jr. (@bertjr.escritor) cria narrativas que envolvem o leitor em uma jornada de questionamentos e risadas, revelando seu olhar crítico e perspicaz sobre a sociedade atual.

Com uma trajetória literária que se estende por décadas, Bert Jr. emergiu como um escritor multifacetado e prolífico. Graduado em História pela UFRGS e em Diplomacia pelo Instituto Rio Branco, sua experiência como diplomata em vários países influencia sua escrita, trazendo uma perspectiva única para suas obras. Desde seu primeiro livro solo de poesia até sua mais recente incursão na ficção, Bert Jr. tem cativado leitores com sua habilidade de abordar temas sérios com uma pitada de humor, deixando uma marca indelével no cenário literário contemporâneo. 

Trabalhando no seu primeiro romance, o autor promete mais uma vez desafiar convenções e oferecer uma visão distinta do mundo ao nosso redor. O recém-lançado "Antes do fim do riso" (editora Oito e Meio, 222 págs.) se passa na capital de um país fictício em um momento pós-pandêmico, que, após a perda de 5 milhões de vidas, passa a apontar o riso e o humor como formas letais de contágio do vírus que devem, portanto, serem erradicadas a qualquer custo. Desta forma, passam a ser adotadas medidas formais e informais de disciplina e censura à sua expressão, como a brigada anti-humor, que têm, como líder, o capitão Genus Miliblaster. 

Você escreve desde quando?

Comecei a escrever poesia por volta dos 17 anos. Nos anos seguintes também produzi uns poucos textos curtos em prosa, entre contos e crônicas. O tom humorístico surgiu nessa fase, mas com menor incidência. Apenas alguns dos poemas desse período de juventude resistiram ao teste do tempo e foram reunidos no meu primeiro livro de poesia: Eu canto o ípsilon E mais, juntamente com poemas escritos em 2020 e 2021. Nenhum dos textos em prosa escritos na juventude subsistiu, por isso me surpreendi quando meu regresso à escrita criativa se deu por essa via.

Se você pudesse resumir os temas centrais do livro, quais seriam?

Cada um dos sete contos que compõem Fict-Essays e contos mais leves possui uma temática própria. 

Neandertala brasiliensis é sobre a  adaptação biológica da humanidade a uma nova era do gelo, provocada pelas mudanças climáticas em curso no planeta, por meio do emprego de carga genética neandertal; VegaLight sobre os possíveis efeitos das dietas radicais e a busca de equilíbrio psíquico; Um tal recital fala do perfeccionismo exagerado e sua flexibilização em resposta a acontecimentos fortuitos; Sincronicidades do esforço de um intelectual para entender a realidade, a partir do desenvolvimento de novos conceitos e ferramentas de análise, e os efeitos emocionais provocados pela expectativa de boa aceitação da obra por parte do público e da crítica; Freddy Quin lida com o dilema entre seguir uma trajetória de sucesso ou abraçar uma vocação latente; Ensino fundamental é sobre lições de vida retiradas de situações vividas na infância; e Quatro teses sobre Deus, finalmente, é uma reflexão humorística sobre a condição humana, na encruzilhada entre as lacunas das explicações científicas acerca das origens do universo e da vida e a dificuldade de compreender a personalidade divina.

Por que escolher esses temas?

São todos temas que, em maior ou menor grau, formam parte das preocupações contemporâneas e, por isso, dizem respeito à grande maioria de nós. Os contos trazem reflexões sobre indagações que nos inquietam: sobreviveremos às mudanças climáticas extremas? Como viver uma vida saudável e com autoestima? Será que o perfeccionismo limita a nossa capacidade de gozar a vida? Será que obras intelectualmente relevantes e originais têm suficiente visibilidade e atenção? Será que podemos optar por uma vocação profissional com futuro incerto quando temos sucesso comprovado em outra área? Será que memórias sofridas da infância podem ser metabolizadas de forma positiva e se transformarem em lições para a vida? Será que sustentar posições não-dogmáticas e um tanto irreverentes nos faz conviver melhor com as dúvidas inerentes à condição humana?

O que motivou a escrita do livro?

Os temas dos contos do livro vinham sendo objeto de reflexão há algum tempo e se relacionam, em sua maioria, com leituras que fiz, por exemplo, sobre pré-história humana, espiritualidade, nutrição e psicologia. O fator que desencadeou o processo de escrita foi o vácuo de atividades sociais decorrente da pandemia de covid-19. Escrevi o livro em pouco mais de dois meses, no primeiro semestre de 2020. A escrita foi intensiva: passei a escrever todos os dias, de madrugada e à tardinha, e os contos foram saindo um depois do outro. O primeiro que escrevi foi Sincronicidades, tendo como protagonista o psicossociólogo, Dr. Raul Reis. Me diverti muito com a criação das estórias e dos personagens, o que talvez explique a intensidade e velocidade do processo de escrita.

O que esse livro representa para você?

Fict-Essays e contos mais leves representa minha estreia, de fato, como escritor. Escrever o livro me deu confiança suficiente para realizar outros projetos. Retomei, por exemplo, a prática da escrita poética, e me animei a publicar Eu canto o ípsilon E mais, em 2021, uma síntese da minha trajetória poética até então.

Por que estrear com um livro de contos?

Gosto de dizer que não escolhi o gênero literário, me sinto escolhido por ele. Para mim, foi uma surpresa que o retorno à escrita criativa tenha se dado pela via da prosa, não da poesia, e que a narrativa possua uma evidente marca humorística. No meu segundo livro de contos, Do incisivo ao canino, predomina também o tom humorístico, embora nem todos os contos possam ser considerados como pertencentes ao gênero do humor. 

Em sua análise, quais as principais mensagens que podem ser transmitidas pela obra?

Acho que a principal mensagem do livro é que podemos realizar reflexões sobre temas sérios de forma bem humorada. O humor possui por natureza um caráter crítico e, portanto, pode ser uma ferramenta para lidar com questões complexas, muitas vezes insolúveis, ou cujas respostas são incertas.  

Como você definiria seu estilo de escrita?

Os contos do livro apresentam um narrador onisciente. No caso de Sincronicidades, o narrador se coloca como um admirador do Dr. Raul Reis, protagonista da estória; em Quatro teses sobre Deus, o protagonista, pastor Adriogil Santos, é em parte narrador ao discorrer sobre cada uma das teses; seus discursos ocupam a maior parte do texto do conto. No geral, os diálogos são poucos e curtos. Três dos contos do livro – Neandertala brasiliensis, Sincronicidades, e Quatro teses sobre Deus – estão classificados como fict-essays, ou ensaios fictícios: um tipo de conto imaginado por mim, em que o fio da estória é a “viagem intelectual” do protagonista. Os ensaios fictícios são mais longos e densos que os demais contos do livro, que classifiquei de “mais leves”.

Quais são as suas principais influências artísticas e literárias?

Na linha do que tenho escrito em prosa, acredito que minhas maiores referências literárias sejam Fernando Sabino, Nelson Rodrigues, Luís Fernando Verissimo, o Drummond cronista, e o Machado de Memórias póstumas de Brás Cubas e Dom Casmurro. Admiro profundamente a obra de Guimarães Rosa e rezo para ser influenciado por ela. Não creio, porém, que o meu livro tenha sofrido influência direta de nenhum desses autores em particular, mas acredito que todos contribuíram, em conjunto, para a forma e o estilo dos textos.

Tem alguma meta diária de escrita?

As linhas gerais da estória surgem e são trabalhadas mentalmente durante sessões de meditação, que podem envolver a degustação de um bom charuto. Não tenho metas diárias de escrita, mas quando dou início a um projeto procuro manter certa regularidade, o que implica escrever diariamente.

Quais são os seus projetos atuais de escrita? O que vem por aí?

Finalizei o original de um romance, que classifiquei como uma distopia humorística. O projeto representou um grande desafio, tanto por ser o meu primeiro romance quanto pelo fato de eu desconhecer antecedentes desse gênero na literatura. A obra está em lançamento pela editora Oito e Meio e se chama “Antes do fim do riso”.

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