Tempos Difíceis

Há um ano por estes dias, imaginávamos que estaríamos assim? De máscaras sanitárias na cara e gel nas mãos...
Temos mais do que razões para temer o futuro próximo.
Foto-composição: A. Guimarães

Há um ano por estes dias, imaginávamos que estaríamos assim? De máscaras sanitárias na cara e gel nas mãos...



Andava eu perdido nas minhas memórias, hoje à tarde, e dei por mim a reflectir no quão dramático tem sido este século, logo desde 2001, com o ataque ao World Trade Center. No mesmo ano, mais tarde, a Guerra do Afeganistão. Em 2002, tivemos o desastre ecológico na Galiza. No ano seguinte, a invasão do Iraque. Em 2004 e 2005, mais ataques jihadistas na Europa, em Londres e Madrid. Perdi-me. Sei que, pelos anos seguintes, tivemos a intervenção na Líbia, ataques em Paris, na Bélgica, uma crise económico-financeira global que nos levou à bancarrota e à intervenção externa... Um sem-número de peripécias. Não bastando, agora, uma pandemia de um vírus misterioso. Ontem mesmo, li sobre ameaças de brotes de peste negra na China, uma doença bacteriana que actualmente é facilmente curável. Aonde iremos parar assim?

Há um ano por estes dias, imaginávamos que estaríamos assim? De máscaras sanitárias na cara e gel nas mãos (e que tanto pão têm dado a comer a quem vive disso)? Temos mais do que razões para temer o futuro próximo. O Apocalipse, retratado na sétima arte e na literatura, cada vez mais é uma fantasia que assumimos como possível, vistas as coisas. Não querendo ser fatalista, que epidemias, crises e guerras houve muitas, o que temos, efectivamente, é a escalada galopante na sucessão de acontecimentos. E ainda só levamos vinte anos! Nas guerras, dispomos hoje de arsenal bélico capaz de destruir o planeta em menos de nada. As crises levam ao endividamento praticamente crónico das famílias, ao surgimento de bolsas de pobreza que torturam as pessoas e as impedem de competir num sistema tão exigente, impiedoso e avassalador. As doenças, bom, pense-se no globalismo e na facilidade com que qualquer vírus, à mercê da democratização no acesso às viagens, tem de se propagar de um continente para o outro e o outro em poucas horas.

Acreditávamos -os que perdiam tempo com isso- que provavelmente desapareceríamos como os dinossauros, devido ao impacto de um meteorito; quiçá quando o Sol deixasse de consumir hidrogénio, aumentasse de tamanho e, por fim, explodisse e engolisse a Terra; ou ainda com o dito aquecimento global, que inviabilizaria a manutenção da vida tal qual a conhecemos. Afinal, a hipótese parcamente especulada de doença pandémica começa a ganhar forma. Quando surge uma doença nova, multiplicam-se as exigências de vacinas. E se elas nem sempre chegarem? Veja-se o VIH/SIDA, cuja cura foi dada como garantida durante anos, e que só ao fim de mais de 30 milhões de mortos conseguimos torná-la crónica, não obstante, com todos os condicionamentos.

De um lado, gozamos de liberdade como nunca antes se vira. Saímos e gostamos de sair. Vivemos melhor, o que se traduz em férias que os nossos avós nem sonhariam, idas a restaurantes, bares, ginásios. Do outro, é bastante provável que tenhamos de aprender a viver com restrições, mais isolados. É nesse confronto e nessa contradição -liberdade e reclusão?- que se jogará a nossa sobrevivência.


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