Num espaço temporal de três décadas quase não
encontro resquícios memoriais dos meus tempos de meninice e juventude.
Escrevo sem pieguices. Todas as épocas têm os
seus registos próprios e o que há a fazer é viver da melhor forma possível.
Mas, em conversa com amigos, de quando em vez,
abro uma fresta da janela do saudosismo.
Lembro-me vivamente de jogarmos com uma “bola”
feita com trapos e sacos de leite. As balizas eram delimitadas por pedras a
fazer de postes, enquanto a barra era à altura da imaginação e da conveniência
se o eventual golo era a favor ou contrário à nossa equipa.
De resto, em dia de sorte, um esférico a valer era
de borracha, já que as de couro limitavam-se aos jogadores a sério. Por vezes,
e depois das transmissões televisivas dos europeus e mundiais de hóquei em
patins, lá íamos imitar os craques lusos para ruas e travessas com os “sticks”
improvisados em toscos paus e, obviamente, sem rodas nas solas das sapatilhas.
Outro divertimento consistia em escorregar,
ajeitado o melhor possível em papelões, pela encosta que circunda a muralha do
Castelo São Baptista em frente ao Relvão.
Depois, havia tempo e uma imensidão de espaços para
atirar o pião, jogar à macaca, brincar ao apanhar e fazer trinta por uma linha. Uns arranhões, nódoas espalhadas pelo corpo,
calçado e roupa danificados representavam apenas pormenores sem qualquer
importância (galhetas dos pais à parte) que marcavam sentimentos de liberdade
plena.
Era, segundo o que penso e os amigos de então, diversão
à grande e sempre com ar puro a servir de atmosfera.
Hoje, as vidas estão dentro dos computadores. Pelo
teclado movimentamos tudo o que é necessário para dar andamento à existência, a
começar pelo trabalho.
As crianças e jovens de hoje encaram o computador
(disponível em várias plataformas) quase como uma extensão corporal.
Um estudo revela que quase 80 por cento dos jovens
portugueses entre os 12 e os 18 anos utilizam sistemas de mensagens
instantâneas da Internet (Messenger) e seis em cada dez fazem-no frequente e
muito frequentemente, passando horas à conversa no computador à conta das redes
sociais.
Os seus códigos comunicativos são quase
indecifráveis. Todos parecem muito felizes à volta dos teclados, embora as
depressões nas idades juvenis subam a um ritmo assustador.
Não sei bem porquê, mas não trocava os meus
passatempos infantis por toda a sofisticação atual.
Garanto que era “bué de fixe” brincar com o céu a
servir de teto e de olhos nos olhos com os companheiros.
Mas, nada de juízos de valor e exercícios
comparativos. Todos devemos ser livres para teclar a felicidade à nossa
maneira...
Uns arranhões, nódoas espalhadas pelo corpo, calçado e roupa danificados representavam apenas pormenores sem qualquer importância (galhetas dos pais à parte) que marcavam sentimentos de liberdade plena.
joaorochagenio@hotmail.com
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