Lady Laura A mãe do Rei

Relembre a primeira entrevista concedida por Laura Moreira Braga em 2004, quando Roberto Carlos completou 45 anos de carreira

Lady Laura com Roberto Carlos, em foto da dévada de 70

O telefone tocou no apartamento da Urca, Rio de Janeiro. Ao soar pela terceira vez a campainha, dona Laura Moreira Braga atendeu e ouviu breves explicações de que a CONTIGO! gostaria de fazer uma reportagem homenageando-a pelo Dia das Mães. Por segundos, que pareciam intermináveis, fez-se silêncio do outro lado da linha antes da resposta positiva da mãe de Roberto Carlos. ''Olha, jamais dei entrevista. Durante toda a carreira do meu menino, essa certamente será a primeira e a única. Não que eu não goste da imprensa, ao contrário, vocês sempre me tratam com muito carinho. É que não sou celebridade, famoso é o meu filho'', frisou. ''Mas entendo que é sobre o Dia das Mães que vocês querem falar comigo, então vamos lá'', concordou Lady Laura, que quebrou o silêncio no ano em que seu caçula completou 45 anos de carreira.
Logo à primeira pergunta, ela deixou bem claro seu jeito simples: pediu para não ser chamada de dona, senhora ou qualquer outra maneira mais formal. E Lady Laura? “Pode. Também pode me chamar de Laura ou de Lalá, como fazem os amigos chegados”, disse.A religiosidade da dona-de-casa mineira, uma face marcante de sua personalidade que se repetiu na conhecida espiritualidade do filho, ficou explícita quando ela contou sua canção preferida: a Oração de São Francisco de Assis. ''A letra traduz exatamente a Lalá. É uma mulher grandiosa e despojada de qualquer luxo. Não conheço ninguém assim'', revelou uma amiga muito próxima da família Braga.Nos primeiros cinco minutos de conversa, a matriarca logo entregou o jogo e falou dos maiores amores de sua vida: os quatro filhos, Lauro, Carlos, Norma e Roberto. ''Amo os meus filhos com a mesma intensidade e consigo dar atenção aos quatro. Por ser o Roberto famoso, acabo aparecendo mais com ele, só isso'', explicou. E o caçula célebre não economizou homenagens à mãe.
A canção Lady Laura, composta em parceria com o amigo de fé, Erasmo, em 1978, não deixa dúvidas do quanto o Rei da MPB sempre foi por ela. ''Quando ouvi a música pela primeira vez, senti uma emoção muito grande, muito forte mesmo, não dá para explicar'', recordou. Até em seus barcos, o cantor e compositor homenageou a mãe, invariavelmente. No seu iate, o Lady Laura III, ele viajou com freqüência pelos mares de Angra dos Reis. E nesses pequenos cruzeiros, uma tradição da família, não abria mão da companhia materna. Diziam os amigos mais íntimos que quando Lalá não estava a bordo, por algum motivo, Roberto lhe telefonava todos os dias para dizer que estava com saudades. Nos shows do filho, ela era presença mais do que obrigatória. Mas não na plateia.
Sempre emocionada, preferia acompanhar nos bastidores dos teatros, estádios e casas de show a performance do filho querido. A extrema discrição remete ao mesmo motivo pelo qual até então não tinha dado entrevistas: não gostava de aparecer. Mas sabia que sua presença era importante para Roberto, que não subia ao palco sem pedir-lhe a bênção. Havia raras ocasiões, é claro, em que Lalá não podia estar presente. Era então que mãe e filho se comunicavam por um telefone azul - para ficar com a cor preferida do rei -, cujo número só a dupla partilhava. Em linha direta, ele era abençoado pela mãe e, ritual cumprido, se sentia seguro para soltar a voz aos fãs. Quando Roberto trabalhava em seu estúdio, Amigo, também no bairro carioca da Urca, não raro Lalá se arrumava toda e fica lá sentadinha, inebriada, vendo o filho em sessões de gravação que muitas vezes atravessavam a noite.
''Eu e ele somos ‘uno’, somos uma pessoa só'', declarou, ternamente.Lady Laura foi uma das maiores incentivadoras da carreira do filho. Quando ele tinha apenas 9 anos, ela o levou para cantar na matinê infantil da Rádio Cachoeiro de Itapemirim, cidade no Espírito Santo onde Roberto nasceu e foi criado. Foi também com a mãe que ele conheceu na infância os primeiros acordes de violão, antes de entrar para o Conservatório Musical de Cachoeiro. Naquela primeira apresentação, Roberto vestia uma camisa feita por Lalá. Por muito tempo, ela fez questão de costurar as roupas do filho e arrumá-lo no maior capricho.Enquanto o sucesso do filho se delineou e ganhou a dimensão que dispensa medidas, Laura e o relojoeiro Robertino, seu marido, falecido em 1980, trataram de lhe dar toda a atenção, sem perder de vista os outros três filhos. Dos quatro herdeiros vieram os descendentes dos quais Lalá tanto se orgulhava.
''Eu tenho muito mais do que poderia sonhar. Ver os meus filhos criados, crescidos, maravilhosos e os meus netos lindos, o que mais posso querer? O meu presente é que eles sejam felizes'', desejava. E não pede mais nada, Lalá? ''Sim, e vou pedir para vocês: faço questão de aproveitar essa atenção e espaço que a revista me dá com tanto carinho para mandar um beijo muito especial para todas as mães do Brasil. Todas, sem exceção, merecem afagos'', finalizou. Roberto Carlos já disse e cantou tantas vezes que Lalá era mesmo uma lady, mas no coração do filho famoso há muito ela foi promovida: ele a reverencia como uma rainha, a rainha-mãe.
Na canção Lady Laura, Roberto lhe fez uma comovente declaração de amor.
O que você sentiu quando ouviu pela primeira vez versos tão tocantes?Foi uma emoção muito grande, muito forte mesmo, não dá para explicar. E foi também uma alegria imensa.
O que gostaria de ganhar neste Dia das Mães?
Eu tenho muito mais do que poderia sonhar. Vejo os meus filhos criados, crescidos, maravilhosos, os meus netos lindos. A felicidade deles é meu melhor presente. Gostaria também de pedir saúde para todos e paz para a humanidade.
Eu queria ver mais justiça, igualdade entre os povos, um mundo com menos miséria, fome e doenças. Peço a Deus por isso todos os dias e todas as horas.
Tem alguma lembrança especial da data?
Tenho muitas recordações, mas não destaco nenhuma. Acho que todo dia é Dia das Mães. De todas as mães. Tenho um filho famoso e, por isso, me tornei conhecida e ganho homenagens. Mas acho que as mães comuns, aquelas que lutam pelo pão de cada dia, que acordam de madrugada para trabalhar e enfrentam frio e chuva para pegar a condução, as que sofrem por não ter com quem deixar suas crianças e que sustentam suas casas merecem todo o meu respeito e carinho. Os filhos dessas mulheres deveriam presenteá-las todos os dias com beijos e afagos, porque, na verdade, o que toda mãe gosta de ganhar dos filhos é carinho e respeito.
Você ainda dá broncas no Roberto?
De jeito nenhum, eu o amo demais, assim como a meus outros filhos, com quem também não brigo.
Roberto começou a aprender a tocar violão e piano ainda na infância. Você o despertou para a música?
Como eu tocava violão, mostrei para os meus filhos as primeiras posições e ensinei-lhes notas como o lá maior, o fá menor e assim por diante. A partir daí, o talento natural do Roberto se impôs e ele buscou se aprimorar. Logo estava estudando piano no Conservatório de Cachoeiro de Itapemirim e não parou mais.
Você também é de Cachoeiro?
Todos pensam que é a minha cidade natal por causa do Roberto, que nasceu lá, mas eu sou mineira, uai (risos). De Mimoso.Foi observando, em casa, o seu cuidado com o jardim que Roberto passou a gostar das plantas e até a falar com elas.
Você também acredita que as rosas falam?
Claro que acredito. Não só as rosas como todas as plantinhas. São seres vivos. Sempre “conversei” com minhas flores e também com os animais. Procurei passar esse amor à natureza para os meus quatro filhos. Por ser o Roberto o caçula e estar sempre perto de mim, quando pequeno talvez tenha assimilado o hábito com maior sensibilidade. Mas, na família, todos são defensores da natureza.
É sabido que você, além de acompanhar o Roberto, não perde de vista nenhum de seus outros filhos. É difícil dividir o carinho entre os quatro?
Amo os meus filhos com a mesma intensidade e consigo dar atenção a todos. Por ser o Roberto famoso, acabo aparecendo mais com ele, só isso. Coração de mãe não tem tamanho nem horário, então atendo a todos igualmente, é só chamar.
Que ensinamentos você fez questão de passar para os seus filhos?
Sou igual a todas as mães que ama seus filhos. Não sou diferente. Procuro oferecer o melhor para eles, dentro de minhas possibilidades, dei-lhes a melhor educação. Passei-lhes noções de caráter, responsabilidade, religiosidade e, principalmente, de humildade. Frisei o quanto é indispensável ter responsabilidades e assumir os erros. E mostrei-lhes o valor mais importante: amar o seu semelhante como a si próprio.
Roberto ainda pede colo para você, como diz um dos versos da letra de Lady Laura?
O meu colo não sai do lugar (risos). É só pedir que o colo estará sempre pronto para os meus filhos.
Você e Roberto costumam trocar confidências?
Sim, claro. Acima de tudo, sou sua amiga. Eu e o Roberto somos ‘uno’, somos uma pessoa só.Falam-se todos os dias, jantam juntos, essas coisinhas do dia-a-dia?Quando ele está no Rio, convivemos e ficamos sempre bem próximos.
Qual sua música preferida entre tantas que seu filho compôs?
Gosto de todas.Mas não há aquela especial com a qual você se identifica mais?Há, sim, vou cantá-la: “Senhor, fazei de mim um instrumento de sua paz...” (risos)
Essa não vale, é a Oração de São Francisco. Diz uma letra de uma música do Roberto...
Então ‘tá’, uma me emociona muito: A Estação (Roberto e Erasmo Carlos, 1974). É mais ou menos assim: ... “Lembrei de tudo como era antes / Sem despedida e vidas tão distantes / Parado ainda na estação ela me viu / Me acenou mais uma vez, depois partiu”...

Por Carla Ghermandi

Revista Contigo

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