Mundo faz operação de guerra contra piratas da Somália

DO TEXTO:
Fragata Álvares Cabral



Hoje em dia, a Somália é considerada mais perigosa que o Iraque e que o Afeganistão. Nem as forças de segurança se arriscam a desembarcar lá. Veja como é o combate.

Há 19 anos em guerra civil, a Somália é um país pobre, sem governo e sem lei. E na costa dessa terra de ninguém, os piratas somális criaram o mar de ninguém.

O repórter Pedro Bassan embarcou em uma patrulha pelas águas mais perigosas do mundo.

A mesquita tem a cor das areias do deserto. E o deserto parece até mais simpático em Salalah. A cidade é um oásis, uma explosão verde nas terras sem vida do Sutanato do Omã. Mas a natureza não disfarça o clima de guerra. O porto de Salalah está repleto de navios militares de vários países. Lá é a principal base de combate aos piratas da Somália.

Eles são conhecidos pela crueldade que tratam suas vítimas. O casal inglês Rachel e Paul Chandler estão sequestrados há quatro meses. Eles navegavam em um pequeno veleiro perto das Ilhas de Seuchelles quando foram capturados. Em um vídeo, o casal faz um apelo às autoridades inglesas, que se recusam a negociar o resgate.

Nas imagens, Paul diz que os piratas estão perdendo a paciência. Os piratas se aproximam fortemente armados, sem a menor preocupação de esconder o rosto. Sob a mira das metralhadoras, Rachel também pede socorro. Quando as palavras vão terminando, um longo segredo deixa claro o desespero dos dois. A situação é humilhante, o olhar sem esperança.

Além de Rachel e Paul, atualmente os piratas da Somália mantêm 250 reféns em dez embarcações ancoradas na costa do país africano. Eles pedem resgate em torno de R$ 13 milhões para libertar cada um. No Porto de Salalah, a equipe do Fantástico embarca em um navio que vai em busca dos piratas.

Em um esquema de revezamento internacional, há um ano, a liderança da patrulha ficou nas mãos de Portugal. No comando das operações, um velho conhecido do Brasil. Quem dá as boas vindas é Pedro Álvares Cabral. Depois de navegar em mares nunca antes navegados, quem diria, ele agora combate piratas na costa da Somália.

“Eu penso que estamos a fazer jus ao nome”, conta o comandante do navio, Jorge de Sousa.

A fragata Álvares Cabral leva 215 marinheiros. Eles estão a caminho das águas mais perigosas do mundo. “Essa missão que estamos aqui é uma forma de guerra. Para mim, estar aqui ou estar na guerra é exatamente a mesma coisa”, diz uma combatente.

Nada de gancho no lugar da mão, tapa-olho ou aquela bandeira com a caveira desenhada, os piratas do século XXI são bem diferentes, mas continuam ousados e violentos. Para combatê-los, é preciso usar equipamento cada vez mais pesado.

Em alto mar, a primeira tarefa é carregar as armas e testar o poder de fogo do navio. Metralhadoras ligeiras na ponta e metralhadoras pesadas na proa e ainda um canhão capaz de afundar um barco pirata com um só tiro. O navio tem um helicóptero armado, dispara rajadas de alta precisão a quase meio quilômetro do alvo.

Em silêncio, a tripulação entra no Golfo do Aden. A região é um dos corredores mais movimentados nas águas do planeta, 25 mil navios, por ano, passam pelo local. Eles levam, para Europa e os Estados Unidos, a produção industrial asiática e principalmente o petróleo do Oriente Médio. E trazem de volta a exportação das maiores potências do planeta. Na esquina dessa avenida marítima, está a Somália.

A guarda-costeira conta apenas com um barquinho, é tudo que eles têm para combater piratas que lançam 200 ataques por ano. A cidade de Bussasso é uma das principais bases da pirataria. Hoje em dia, a Somália é considerada mais perigosa que o Iraque e que o Afeganistão. Nem as forças de segurança se arriscam a desembarcar lá.

O dia termina e a noite é amiga dos piratas. Eles costumam se locomover na escuridão e atacar na alvorada. O navio português acorda às 6h. No convés, o helicóptero ainda é uma sombra quando começa a ligar os motores. Os primeiros raios de sol são uma ordem: a busca vai começar. Quatro tripulantes formam a patrulha do ar. E hoje, todos os que ficaram no navio gostariam de estar voando também.

Emergência a bordo. A brigada de incêndio entra em ação. Marinheiros mascarados correm pelos corredores. Lá fora a fumaça aumenta. Um ferido é resgatado. E o sargento fica ali parado, como se não estivesse acontecendo nada.

“É evidente que isso é só um exercício. Não é para ninguém se assustar, isso
acontece várias vezes”, explica o sargento.

É preciso deixar o navio em alerta permanente.Sem piratas no horizonte, o navio se mantém ativo com os treinamentos. O helicóptero despeja fuzileiros. E a marujada solta a voz. O navio português balança em ritmo brasileiro. E o sotaque segue a maré. Viver a bordo é ser feliz e ansioso, tudo ao mesmo tempo.

O mar está calmo e isso é um péssimo sinal. Essas águas tranquilas do Oceano Índico são um grande incentivo aos piratas. Assim eles podem percorrer grandes distâncias em pequenas embarcações. O helicóptero vai sair para varrer o oceano com os olhos. Os radares não detectam os barcos piratas.

“São embarcações muito pequeninas. Ainda por cima são de uma cor que não é fácil de ver”, afirma a combatente.

Só eles conseguem enxergar o pontinho branco, escondido atrás da próxima onda. São os piratas. Nem debaixo da metralhadora eles se assustam. Discretamente começam a jogar no mar as armas, as cordas, os ganchos, tudo o que os incrimine.

Mas só quem quer abordar outro navio leva uma escada. Não há prova maior do que essa. Mas eles logo se desfazem dela. Os piratas agem sem medo porque sabem que os marinheiros do Ocidente não atiram. O helicóptero dispara e talvez agora eles não tenham tanta certeza.

O helicóptero neutraliza os piratas até a chegada da lancha com os fuzileiros do navio. Eles ainda tentam conversar. Dizem que são ‘fishermen’, pescadores, em inglês.

“Nós perguntamos: ‘onde é que está o peixe?’ e eles não sabem responder”, aponta o fuzileiro.

Agora já não há muito o que fazer. Sem provas ou flagrante da pirataria, o navio só pode confiscar o excesso de gasolina e mandar os piratas de volta para a Somália. Logo vão estar prontos para atacar outra vez.

Agora o helicóptero da Álvares Cabral levar a equipe do Fantástico para sobrevoar o litoral da Somália e identificar algumas bases de onde partem os piratas. São três mil quilômetros de praia. Os piratas têm todo esse espaço para sair e atacar os navios. É praticamente impossível fiscalizar toda a região.

Os piratas também usam muito grutas nas encostas das montanhas. Nelas, eles se escondem e partem para os ataques. Uma aldeia é uma base pirata. Eles partem de lugares muito pobres e quando chegam, distribuem o valor do resgate entre todos os moradores. Por isso a pirataria tem um forte apoio popular na Somália.

Nossa equipe vai embora levando a imagem das praias. Do contraste gritante entre o deserto de pedra e a exuberância da vida no mar. Uma baleia aparece para se despedir. Adeus Álvares Cabral. O descobridor do Brasil está ajudando a redescobrir a Somália. Um país que está em todos os mapas e o mundo esqueceu.

In Fantástico
22-02-2010



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1 Comentários

Comentários

  1. Oi maninho!

    Que coisa impressionantes esses piratas.
    Antigamente era coisa de filmes,
    hoje uma realidade. E muito triste!

    Beijos,
    Carmen Augusta

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