NOVO ACORDO ORTOGRÁFIO DA LÍNGUA PORTUGUESA – Acordos e desacordos.

DO TEXTO:

Escritora portuguesa diz que Acordo Ortográfico é "pirata"
Para Inês Pedrosa, ortografias de Portugal e Brasil não estão sendo unificadas

Vencedora do prêmio Máxima de Literatura, dado em Portugal, diz que não vai adotar as novas regras ortográficas em seus livros

DA REPORTAGEM LOCAL
O novo sistema ortográfico é considerado "um acordo em desacordo" pela escritora portuguesa Inês Pedrosa, que promete continuar seguindo a antiga regra em seus livros. Nascida em Coimbra em 1962, Pedrosa venceu o prêmio Máxima de Literatura, dado em Portugal, com o livro "Nas Tuas Mãos". Ela já foi também diretora da versão portuguesa da revista "Marie Claire". (MÁRCIO PINHO)

FOLHA - A sra. é contra ou a favor do Acordo?
INÊS PEDROSA - Sou contra, porque, para começar, o Acordo é um produto falso, um produto pirata. Na verdade, ele não estabelece um acordo. Significa, então, jogar livros fora. O Acordo Ortográfico uniformiza umas coisas, mas altera outras. Vamos supor que ele significasse a unificação gráfica do português. Tampouco sou a favor, mas isso poderia ter um interesse pedagógico. Se por um lado poderia criar um monopólio na edição, poderia gerar manuais escolares comuns, o que seria uma vantagem.
FOLHA - Por que não considera o novo sistema um Acordo?
INÊS - Porque ele cria muita confusão, é inútil e prejudicial. É um acordo em desacordo. O hífen, por exemplo, gera confusão. Além disso, muita coisa é definida de acordo com a pronúncia, e palavras que hoje têm determinadas letras internas, como "concepção", no Brasil, não deixarão de ser escritas e faladas assim para usar a nova versão portuguesa, que muda de acordo com a pronúncia, desuniformizando-se, passando a escrever "conceção". O trema, por exemplo, que Portugal já não usava, acredito que faz falta. Como vamos explicar a quem aprende a língua que certos "us" se pronunciam? A palavra "sequestro", por exemplo: em Portugal pronuncia-se muitas vezes, erradamente, como "sekestro", sem "u".
FOLHA - O que acha da mobilização em torno ao Acordo? PEDROSA - Gostaria que todo o dinheiro gasto em encontros, viagens e reuniões para se debater o Acordo tivesse sido investido em iniciativas para promover uma ponte cultural entre os países de língua portuguesa. As iniciativas são raras.
FOLHA - Como os portugueses veem e se preparam para o Acordo?
PEDROSA - Ainda não vi nenhum jornal anunciar que irá adotá-lo a partir de janeiro. Há portugueses entretidos em contar quantas adaptações terão de fazer em relação aos brasileiros. Mudam principalmente as palavras com determinadas consoantes internas. Mas vejo essa guerrinha de quem deve liderar as discussões do idioma português inútil. Não vejo problema de o Brasil, um país com quase 200 milhões de pessoas, liderar as discussões [Portugal tem cerca de 10 milhões]. Acredito que as diferenças hoje estão entre o Brasil e os outros países, que têm um idioma mais semelhante ao de Portugal, pois foram colônias até mais recentemente.

BRASIL

Para Rubem Alves, o povo faz a língua

REPORTAGEM LOCAL
Para o escritor Rubem Alves, 75, quem deveria ter feito a reforma eram os escritores, que são os "amantes da língua", e não os gramáticos.
O colunista da Folha diz que não irá se adaptar às mudanças nos seus livros, mas diz que, na sua coluna semanal, aceitará a reforma. A exceção será para os casos em que houver prejuízo à compreensão do texto. "Há situações em que vou desobedecer."
Leia trechos da entrevista. ( LUISA ALCANTARA E SILVA)

FOLHA - O senhor é favorável ao Acordo?
RUBEM ALVES - Não seguirei. O povo faz a língua, não os gramáticos. Há coisas horríveis na língua, como "pra mim fazer", mas, como falam, mais cedo ou mais tarde isso fará parte da gramática.
FOLHA - Como fará com os seus livros? Não vai querer que mudem?
ALVES - Não. Já numa outra reforma, antigamente havia estória e história. Os gramáticos tiraram "estória", deixando apenas história, mas são tão diferentes quanto abacaxi e ovo de avestruz. Escrevi um livro baseado na diferença entre história e estória. A história é aquilo que ocorreu no passado e nunca mais acontece, a estória é aquilo que acontece toda vez que ela é contada. Você sabe que o maldito revisor, sem me consultar, botou tudo igual, tudo com "h" e arrasou o livro.
FOLHA - E agora, como o livro é publicado?
ALVES - Voltou ao certo, quando tem estória é estória e quando é história é história [a primeira edição da obra foi publicada como "O Poeta, o Guerreiro, o Profeta"; a versão atual é "Lições de Feitiçaria - Meditações Sobre a Poesia"].
FOLHA - Então o senhor não vai querer que os seus livros sejam adaptados?
ALVES - Ah, não quero que seja adaptado, não. Sabe, estou meio como o [escritor português José] Saramago. Ele não admite que ninguém corrija o português dele. Não tem ponto, não tem vírgula. Acho que seria melhor se os escritores tivessem se reunido para fazer a reforma, e não os gramáticos.
FOLHA - Por quê?
ALVES - Porque os gramáticos são os anatomistas da língua, e os escritores são os amantes. Então, eles têm regras diferentes

ANGOLA

População ignora tema, diz Ondjaki

DA REPORTAGEM LOCAL
Nascido em Luanda, a capital de Angola, em 1977, o escritor e poeta Ondjaki afirma que falta divulgação sobre o Acordo Ortográfico e que as novas regras não preocupam os angolanos atualmente. O país deverá ratificar o acordo neste ano, não o tendo feito em 2008 em razão da mobilização em torno de eleições nacionais, segundo o governo. Morando hoje no Rio de Janeiro, após uma passagem por Portugal, Ondjaki tem entre suas obras livros infantis como "Ynari: A Menina das Cinco Tranças", de 2004, e correalizou o documentário "Oxalá Cresçam Pitangas - Histórias de Luanda", em 2006. Leia trechos da entrevista à Folha. (MP)

FOLHA - Qual a sua opinião sobre as novas normas?
ONDJAKI - Não estou suficientemente informado sobre este Acordo e tenho pena disso. Acho que não circula suficiente informação, mas sobretudo não se sabem as razões que levam à assinatura do Acordo. Acompanho a imprensa angolana com muita atenção e vejo que o problema de divulgação sobre o Acordo é ainda mais acentuado em Angola.
FOLHA - Acredita que há alguma desvantagem em unificar a grafia, do ponto de vista cultural, prático?
ONDJAKI - Só penso no ponto de vista artístico, da escrita literária. Há algo de tom, cheiro e personalidade que se vai perdendo.
FOLHA - Como será a recepção às novas normas em países africanos como Angola?
ONDJAKI - Não sei como será, e essa questão tem sido muito pouco debatida no nível da sociedade em geral. Não penso que a questão do Acordo Ortográfico preocupe os angolanos neste momento.
FOLHA - As normas afetam a vida prática das pessoas ou apenas escritores, jornalistas?
ONDJAKI - Afetam a vida de todas as pessoas que escrevem corretamente e que dão atenção aos pequenos detalhes.
FOLHA - Acredita que as regras irão pegar?
ONDJAKI - Acho que vai ser uma questão de geração. Quem estiver na escola e aprender tudo com as novas regras possivelmente até achará a nossa escrita obsoleta. É normal. E eu acharei a escrita deles simplificada demais ou simplesmente estranha.

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11 Comentários

Comentários

  1. Olá, Guta!

    O Novo Acordo Ortográfico a mim não afecta (afeta) em nada pois desde que obtive o diploma do Curso “Robertologia Aplicada”, em que obrigatoriamente tive que contactar (contatar), a maior parte das vezes por escrito, milhares de brasileiros, às vezes dou por mim a misturar alhos com bugalhos, que o mesmo é dizer falando e escrevendo brasuca em vez de portuga.

    Além disso, como que a complementar o curso supra, desde que em 5 de Março de 2005, aconteceu o “1º Bate-papo entre Roberto e eu” que quer eu, quer o Roberto Carlos e outras personalidades da música da MPB, tais como o maestro Eduardo Lages e Caetano Veloso, misturamos brasuca com portuga nas nossas conversas telefónicas e de Messenger, ao ponto de eu dizer e escrever: “Oi, Róberto, cê tá légau, cara!” e ele responder: Tá tudo porreiro, pá!

    Aliás, parece-me que a própria Guta, uma ocasião ao falar com o seu marido, aplicou a expressão “carago”, bem portuense. Ou estou enganado?

    :)

    Grande abraço

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  2. Ola Guta! olha para mim està muito mais dificil que para o Mindo, porque à partida e meu Portugues é mais rafeiro muito novo levaram-me para o estrangeiro e em cima tenho que tentar escrever o Portugues Brasileiro tudo isso sem contar o termendo do cançasso que eu ganhei com esta historia do splish, splash mas esta historia esta sendo intersante.ABRAçOS fortes chao.

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  3. Olá Guta!

    Sobre o acordo ortográfico, em Cabo-Verde, não sei como é que ficou, pois não sei se sabe, vivo há muito anos em Portugal. Sei que, lá estavam de acordo em adoptar as novas regras ortográficas.
    Para nós que já escrevemos, há muito tempo, talvez, seja um pouco confuso, mas o que eu acho é que os que estão a aprender a escrever, agora, será mais fácil.
    Mas isso, é minha opinião.

    Beijos amiga Guta

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  4. Olá, Manuel!

    eheheheheh

    Essa de "tudo isso sem contar o termendo do cançasso que eu ganhei com esta historia do splish, splash", fez-me rir pra carago!

    Pra quem está em França desde os 10 anos, admiro-me como escreves tão bem português e mais admiro o facto de não teres problema nenhum de escreveres para trocares ideias e opiniões com a malta.

    É assim mesmo, pá!

    Grande abraço

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Olá Guta!

    Esse assunto já gerou muitos debates entre a população, até mesmo aqui no Blog, onde essa matéria foi exposta por duas vezes e com essa, a terceira.

    E vai continuar a existir os que concordam e os que discordam, embora essas mudanças ortográficas tenham sido elaboradas por gramáticos ou escritores literários, ou pedadagogos ou como se diz por Doutores em Educação, sempre irá ter conflitos ou dilemas sobre o assunto que vai dá ainda muito pano pra mangas.

    Se não há nenhuma autonomia do governo ou nem interessse dos órgãos responsáveis para que possa por em pratica, enquanto isso, vai acontecer sempre polêmicas, seja através de entevistas com escrtores ou seja com o povo mesmo, que como diz Rubéns Alves, " O povo faz a sua própria língua".

    E assim a água vai correndo em direções contrárias ou favoráveis e vamos ver até onde vai parar esse asssunto, que sabemos que a língua é composta por vaários dialetos dentro do próprio país imagine nos diversos países! As mudanças continuarão sempre ocorrendo, estejam elas em documentos ou não.

    Um beijo Guta!

    Mazé Silva

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  7. Olá Armindo!

    Não estás enganado amigo,falei e falo ainda...Carago!

    Hoje mesmo, estávamos num shopping e passou um senhor por nós e disse algo sobre "terno". Eu disse para
    meu marido, terno não, "facto"....

    Quer melhor acordo que este?
    Você fala brasuca e nós aqui do blog portuga...
    Ora pois!

    Um beijo,
    Carmen Augusta

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  8. Oi querido Manuel!

    Para nós também está difícil esse "acordo". É muito estranho ver as palavras que até ontem acentuamos, sem acento, as que levavam hìfem sem ele e assim por diante. Não sei se vou me acostumar e reaprender...

    Um abração.
    Carmen Augusta

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  9. Olá Amiga Dina!

    Penso como você, esse "acordo" para nós vai ser uma barra...
    Para os que estão começando, se alfabetizando agora, tudo bem, mas por exemplo a geração de minhas minhas netas que já aprenderam,
    vão fazer uma tremenda confusão. E os livros? Quantos gastos!

    Eu acho que isso não foi bem pensado. E quem deria ter sido consultado não foi.

    Sempre tive e continuo com minhas reservas....

    Obrigada e um beijo,
    Carmen Augusta

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  10. Oi Mazé!

    Amiga, eu sempre tive minhas reservas sobre esse "acordo".

    Discutimos mesmo muito aqui sobre ele, e acho que isso vao longe...

    Acho que as palavras ficaram horríveis sem o trema, sem o hífem, sem acentos...

    Não sei se vou me acostumar...
    Coitadas de minhas netas, vai ser uma confusão na cabeça delas...
    E assim toda criançada.

    Obrigada amiga.

    Um beijo,
    Carmen Augusta

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  11. Armindo, antes que me corrija, corrijo eu, é "fato"... Certo?

    Manuel, como disse o Armindo, para quem está na França há tantos anos você escreve muito bem o português.
    E nos entendemos bem, né?
    Esqueci de agradecer seu comentário lá em cima. Desculpe.
    Obrigada.

    Um beijo para vocês amigos queridos,
    Carmen Augusta

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