Estudo revela que níveis elevados de PAI-1 dificultam a dissolução dos coágulos
Pacientes com câncer de pâncreas têm risco elevado de trombose
São Paulo – outubro 2025 - Entre todas as formas de câncer, o de pâncreas é o que apresenta o maior risco de tromboembolismo venoso (TEV), uma condição potencialmente fatal causada pela formação de coágulos sanguíneos. O problema pode atrasar o tratamento e é estimada como a segunda causa de morte mais comum em pacientes oncológicos, atrás apenas do câncer em si. “A trombose ocorre quando, devido à má circulação, há o desenvolvimento de um ‘trombo’, um coágulo sanguíneo, no interior das veias que causa uma inflamação dos vasos. Em casos mais graves, esse coágulo pode se desprender da parede da veia e se deslocar até o pulmão, gerando uma embolia pulmonar que, muitas vezes, é fatal”, diz a cirurgiã vascular Dra. Aline Lamaita*, membro da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular. “Há algum tempo já se sabe que pacientes com câncer de pâncreas são hipercoaguláveis, ou seja, apresentam maior risco de trombose. Além disso, um estudo recente mostrou que um subconjunto de pacientes é hipofibrinolítico, ou seja, apresentam reduzida capacidade de degradação sanguínea, sendo dessa forma um agravante para a trombose”, explica o Dr. Ramon Andrade de Mello*, médico oncologista do Centro Médico Paulista High Clinic Brazil (São Paulo) e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Cancerologia. O estudo foi publicado em julho no Journal of Thrombosis and Thrombolysis e lançou luz sobre os mecanismos por trás dessa tendência.
De acordo com o Dr. Ramon, o estudo é importante para apontar novos caminhos para o diagnóstico e o tratamento da trombose em pacientes com câncer pancreático. “A pesquisa revelou que pacientes com esse tipo de tumor frequentemente apresentam uma condição chamada hipofibrinólise, ou seja, uma dificuldade maior em dissolver coágulos sanguíneos, mesmo quando em uso de anticoagulantes. O principal responsável por essa dificuldade parece ser uma substância chamada PAI-1, inibidor do ativador do plasminogênio (um inibidor natural da fibrinólise). Em níveis elevados, o PAI-1 impede a ação do tPA, enzima essencial para quebrar os coágulos de fibrina”, diz o Dr. Ramon.
A trombose pode afetar qualquer paciente oncológico, já que fatores comuns no manejo do câncer estão associados ao surgimento da doença. “Alguns tratamentos utilizados por pacientes oncológicos, como certos medicamentos quimioterápicos e terapias-alvo, podem interferir no crescimento de vasos sanguíneos, causar lesões nos vasos já existentes e favorecer a coagulação, levando assim à trombose”, diz o Dr. Ramon. A internação também é um fator de risco. “Quando está internado, o paciente se movimento menos e, consequentemente, a musculatura da panturrilha, responsável por bombear o sangue e ativar a circulação, fica parada. Com isso, há surgimento de inchaço, sensação de pernas pesadas e aumento da predisposição a varizes e trombose", explica a Dra. Aline Lamaita. “Muitos pacientes se sentem cansados e fadigados, sem energia, após os tratamentos quimioterápicos e podem ficar mais tempo na cama – e o sedentarismo é um fator de risco”, completa o Dr. Ramon.
O estudo mostrou que pacientes com câncer de pâncreas, especialmente os que também têm diabetes ou que tiveram COVID-19, apresentaram níveis ainda mais elevados de PAI-1, o que agrava a situação. “De forma geral, a incidência de trombose em pacientes de COVID-19 pode chegar a 16%, mas isso obviamente naqueles pacientes que são internados, que vão ter quadros mais graves. Mas a doença por si só pode estar relacionada com trombose, mesmo em pacientes assintomáticos. Eles podem ter como manifestação do COVID-19 só uma trombose venosa profunda, o que estamos vendo com frequência nos consultórios vasculares desde o começo da pandemia, então isso também aumentou e entrou na nossa listinha como um fator de risco para a trombose”, explica a Dra. Aline. “O diabetes e a infecção pelo coronavírus são condições que, por si só, já alteram a estrutura da rede de fibrina no sangue e aumentam a resistência à dissolução dos coágulos. Essa sobreposição de fatores em um paciente de câncer de pâncreas já cria um cenário ideal para a formação e persistência de trombos”, comenta o Dr. Ramon.
Outra descoberta importante do estudo é que a estrutura da rede de fibrina nesses pacientes é mais densa e com poros menores. “Embora isso normalmente indique maior resistência à degradação, os pesquisadores não encontraram relação direta entre essa estrutura e a dificuldade de lise (quebra) dos coágulos. Em vez disso, a quantidade de PAI-1 foi o único fator que se correlacionou fortemente com o atraso na degradação dos coágulos, reforçando seu papel central no processo”, diz o Dr. Ramon.
Em casos de pacientes oncológicos, é possível adotar medidas de profilaxia para reduzir o risco de trombose, mas em alguns pacientes com câncer de pâncreas isso pode não surtir efeito. “As recomendações para evitar a trombose em pacientes oncológicos podem variar caso a caso, dependendo de fatores como tipo e estágio de câncer, predisposição à doença, tratamento e necessidade de indicação, mas baseiam-se, principalmente, no uso de medicamentos anticoagulantes”, diz a Dra. Aline. “Apesar de todos os pacientes analisados estarem em tratamento com anticoagulantes — como heparina, apixabana ou enoxaparina — eles ainda apresentavam sinais de hipercoagulabilidade, o que evidencia que os medicamentos convencionais não são suficientes para conter esse processo. Isso ocorre porque esses fármacos atuam na formação dos coágulos, mas não agem diretamente sobre o PAI-1, que é o maior responsável pela dificuldade de dissolvê-los. A conclusão dos pesquisadores é clara: há uma necessidade urgente de incorporar a dosagem de PAI-1 na rotina clínica de pacientes com câncer de pâncreas, especialmente daqueles que também apresentam diabetes ou histórico de COVID-19”, comenta o Dr. Ramon. “Além disso, o desenvolvimento de medicamentos que atuem diretamente sobre o PAI-1 pode abrir uma nova e promissora frente terapêutica, que pode não só reduzir o risco de trombose, mas também inibir o crescimento tumoral e a metástase”, finaliza o Dr. Ramon.
*DRA. ALINE LAMAITA: Cirurgiã vascular, membro da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV). Membro da Sociedade Brasileira de Laser em Medicina e Cirurgia, do American College of Phlebology, e do American College of Lifestyle Medicine, a médica é formada pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (2000) e hoje dedica a maior parte do seu tempo à Flebologia (estudo das veias). Curso de Lifestyle Medicine pela Universidade de Harvard (2018) e pós-graduação em Medicina Integrativa e Longevidade saudável. A médica possui título de especialista em Cirurgia Vascular pela Associação Médica Brasileira / Conselho Federal de Medicina. RQE 26557. Instagram: @alinelamaita.vascular
*DR. RAMON ANDRADE DE MELLO: Médico clínico-geral, com Pós-Doutorado clínico no Royal Marsden NHS Foundation Trust (Londres, Inglaterra), residência em Medicina Interna (clínica médica) no Hospital São João, da Universidade do Porto (Portugal), Doutorado (PhD) em Oncologia Molecular pela mesma faculdade e MBA executivo em administração de clínicas, hospitais e indústrias da saúde pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), São Paulo. É pesquisador e professor de Clínica Médica da Universidade Nove de Julho (UNINOVE), de São Paulo; pesquisador honorário da Universidade de Oxford e vice-líder do programa de Mestrado em Oncologia da Universidade de Buckingham, ambas da Inglaterra. É membro do corpo clínico do Hospital Israelita Albert Einstein, Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo, e do Centro de Diagnóstico da Unimed, em Bauru, SP. Instagram: @dr.ramondemello
Obter link
Facebook
X
Pinterest
Email
Outras aplicações
Enviar um comentário
Comentários
DIGITE PELO MENOS 3 CARACTERES
Close
🍪 Este site usa cookies para melhorar a sua experiência.
✖
Tem curiosidade sobre um tema, um nome? Encontre aqui.
Estudo revela que níveis elevados de PAI-1 dificultam a dissolução dos coágulos
Uma romântica que acredita no amor eterno. Redatora do Portal Splish Splash. VER PERFIL
Comentários
Enviar um comentário
🌟Copie um emoji e cole no comentário: Clique aqui para ver os emojis