DUDU SORRISO

DO TEXTO:

Dudu Braga

CLAUDIA GISELE - 2008 -

Há um pouco de melancolia nos fins de tarde do Guarujá. Os pés afundam na areia morna dessa bela cidade do litoral Sul paulista. O nariz se embriaga de maresia e os ouvidos são invadidos pelo som das ondas que arrebentam na areia. Em outros tempos, Dudu Braga estaria com sua prancha nos braços, vestindo o macacão de neoprene e procurando, no mar, o ponto em que se formam as melhores ondas para surfar. As mesmas que, hoje, ele só pode adivinhar pelo som da água em movimento. Este poderia ser o início de uma história triste, mas o estilo não faria justiça ao personagem principal. As frases, contudo, traduzem o que Dudu Braga chama de "saudade doída". A abertura deste perfil também é uma brincadeira com Segundinho (logo você entenderá o apelido). Ao ouvir as primeiras linhas deste texto, ele provavelmente pensará: "vai começar o dramalhão." Vamos passar longe disso.

O desapego ao baixo-astral é a primeira coisa que se percebe em um encontro com Dudu Braga. A segunda é seu bom humor contagiante. Quem assiste a TV Record nas manhãs de sábado, já se deu conta que o apresentador do Programa Ressoar é um sujeito de riso fácil. Roberto Carlos Braga II (assim mesmo, com algarismos romanos para indicar que é filho do rei da jovem Guarda, Roberto Carlos - por isso o apelido Segundinho), 39 anos, traz no registro civil a identidade do pai famoso. Profissionalmente, preferiu ser apenas Dudu. O nome ele ganhou ainda criança, porque a família achou que a canção "O sorriso de Dudu", sucesso de Eduardo Araújo na década de 70, parecia feita sob medida para ele. Roberto Carlos Braga, o rei, já era recordista de vendas de discos e sucesso no cinema e na televisão. O nascimento do Segundinho virou notícia, assim como o fato de ter nascido com glaucoma congênito e cego do olho direito. Para salvar a outra vista, Roberto Carlos e a mulher, Cleonice Rossi, levaram o filho para a Holanda com 15 dias de vida para ser operado.

Para preocupação do pai, Dudu cresceu amando jogar futebol e surfar. "Ele tinha medo que eu machucasse o outro olho", conta. "Já minha mãe me incentivava a ser livre e independente." Hoje, pai de dois filhos, Giovanna, de 10 anos, e Gianpietro, de 5, ele afirma entender a preocupação do pai. "Com os filhos, a gente entende melhor nossos pais." Da mãe, Dudu herdou o bom humor e o espírito aventureiro. "Ela foi uma pessoa de presença marcante, muito intensa, muito viva."

Cleonice morreu quando ele tinha 21 anos, vítima de câncer, um ano antes de Dudu sofrer o descolamento de retina que provocou a perda de sua outra vista. Ele havia acabado de concluir a faculdade de publicidade e propaganda e estava dirigindo para o litoral quando uma mancha escura bloqueou parte da visão. Dudu passou dois anos se tratando em Houston, nos Estados Unidos. Durante seis meses, permaneceu em repouso absoluto para tentar reverter os efeitos do descolamento da retina. Nesse período, Dudu brinca que quase virou budista, poi teve tempo de sobra para refletir e entendeu que seria melhor aceitar a perda da visão sem lamentações. Ele tinha uma noiva na época, que entrou em depressão por conta da nova condição de Dudu e terminou o relacionamento. "Entrei numa fossa danada, mas o fora que levei me ajudou a perceber que precisava superar tudo e seguir a vida." Na volta ao Brasil, com apenas 5% da visão do olho esquerdo, que permite a ele perceber um pouco de luminosidade, Dudu passou a trabalhar no escritório do pai. Avesso a badalações, sempre preferiu atuar nos bastidores, com produções artísticas. Mas o trabalho nunca foi suficiente para gastar sua energia. Como não poderia mais surfar nem jogar futebol, adotou o hábito de fazer academia e tocar bateria diariamente. "Arranho o violão", conta.

Ainda hoje, seu dia de trabalho começa às 11h, depois de ter malhado e esfolado as baquetas na sala de música, que montou no subsolo do prédio onde vive com a segunda mulher, Valeska Silva. O trabalho no rádio começou há oito anos, quando foi entrevistado em um programa da rádio Nativa, que era dedicado às músicas de Roberto Carlos. A participação chamou a atenção dos fãs do rei da Jovem Guarda que, ao ouvirem Dudu, sentiram-se mais próximos do ídolo. O convite da rádio para ser apresentador do programa "As canções que você fez para mim" veio na seqüência e ele ajudou a emissora a tornar-se líder de audiência no horário. "Ele é perfeccionista", conta a mulher. "É capaz de refazer uma coisa várias vezes até se convencer que ficou bom."

A história na televisão é mais recente. Por ser deficiente visual, Dudu foi procurado por Glória Perez, autora da novela América, da Rede Globo, que buscava informações para compor um personagem cego. Em 2006, quando América foi ao ar, Dudu sugeriu que a autora incluísse um programa de entrevistas na trama, em que casos reais de pessoas com deficiência fossem contados. A sugestão virou um quadro na novela, apresentado pelo próprio Dudu. Depois da experiência na Globo, ele foi convidado para apresentar o programa Ressoar, da TV Record. Com a atuação no rádio, garantiu intimidade com o microfone, mas atuar em um estúdio de televisão interagindo com várias câmeras era inusitado para ele. "Ainda vou fazer um programa em que as câmeras é que precisarão me buscar e não me preocuparei em dirigir o rosto para elas."

Há dois anos na Record, o apresentador conseguiu melhorar o hábito que tinha de virar o rosto para o lado direito, uma tentativa de buscar a claridade do ambiente com o resquício de visão do olho esquerdo. O texto e a linguagem não são problemas para ele. No entanto, os programas dificilmente saem do jeito que gostaria que fossem ao ar. "Sempre há alguma coisa para melhorar, mas não posso refazer tudo o que gostaria pois a gravação de um programa é muito complexa. Muitas vezes, prefiro nem assistir."

Segundo Valeska, o lado exigente de Dudu fica sempre no trabalho. Em casa, ele é o cara tranqüilo que conserva hábitos simples e procura se virar sozinho em qualquer situação. "Dificilmente, ele precisa de minha ajuda. Nos ambientes familiares, é totalmente independente. A gente até esquece que tem uma deficiência."

A prima, tia e mãe Vera Schincarioli, como Dudu gosta de brincar, costuma dizer que ele é um "amor de menino". Dudu e as irmãs, Ana Paula e Luciana, passaram a morar com Vera, que é prima de Cleonice Rossi, depois de sua morte. Por isso, quando assiste ao primo na televisão, o sentimento de Vera é de orgulho, como se ela fosse a própria mãe de Dudu - feliz ao acompanhar a carreira que ele vem construindo. "Dudu sempre foi um exemplo para a família. A mãe dele tinha toda razão quando dizia que ele é um menino iluminado."

Entre os amigos, a admiração continua. Dudu era o pirralho da turma, cerca de três anos mais novo que os amigos, o que na adolescência significa uma grande diferença. "Ele se aproximou da gente porque queria aprender a surfar", conta o empresário Renato Levy. "Como tinha motorista, nós falamos que ele poderia andar com a nossa turma mas teria de liberar o carro para a gente viajar para a praia." O que começou com um acordo entre meninos, transformou-se em uma grande amizade. A casa de praia de Dudu virou o ponto de encontro do grupo, que descia quase todo fim de semana para o Guarujá (SP). 


Apesar de ser muito discreto, fugir de badalações e odiar que descobrissem que era filho de Roberto Carlos, ele sempre fez o tipo sociável e bom papo. Quando perdeu a visão, Dudu manteve o estilo, assim como o otimismo, o que fez com que os amigos tivessem ainda mais respeito pelo garoto "cara de pau" que um dia quis se intrometer na turma dos meninos mais velhos. "Nos falávamos muito por telefone quando ele ficou em Houston. Nunca ouvi o Dudu se lamentar ou reclamar de alguma coisa."

No fim do ano passado, quando passou 15 dias de férias no Guarujá, Dudu pôde recordar as histórias das primeiras ondas com os filhos, improvisar um som com os amigos e também permitir-se momentos de melancolia. Discreto como sempre e com a praia vazia, ele arriscou pegar algumas ondas com a ajuda de um pranchão e de amigos. A adrenalina pode não ter sido a mesma, a velocidade pode ter diminuído, mas Dudu, que tem Segundo no nome, tornou-se o número Um. No quesito sorrisos, é imbatível. E no fim das contas, isso é o que mais importa.

PROGRAMA RESSOAR

Dudu Braga e a atriz Bianca Rinaldi apresentam o programa Ressoar, da Rede Record, desde setembro de 2005, abordando iniciativas de empresários e da sociedade civil ligadas ao Terceiro Setor. Essa experiência, segundo Dudu, tem rendido importantes lições - especialmente pela oportunidade de conhecer trabalhos sérios, feitos com o propósito de melhorar a vida das pessoas. "Num dos programas visitamos um hospital de tratamento de câncer infantil. Fiquei tocado com a energia das crianças. É impossível não refletir sobre a vida após uma experiência dessas", afirma Dudu. O programa Ressoar é exibido aos sábados, às 10 horas, em rede nacional, pela TV Record.

AS CANÇÕES QUE VOCÊ FEZ PARA MIM

Diariamente, às 5 horas, a sintonia 95,3 FM é preenchida com a voz de Dudu Braga, que apresenta o programa "As Canções que Você Fez Pra Mim", líder do horário, em São Paulo, na rádio Nativa. O repertório de músicas inclui apenas canções de Roberto Carlos e os ouvintes têm a oportunidade de conversar por telefone com Dudu no quadro "Um segundo com Segundinho". Quando estreou na Nativa, há oito anos, a vinheta do programa anunciava a locução de Dudu Braga, o Segundinho. Então, Dudu era mais conhecido pelo apelido que fazia referência ao pai. Hoje, a vinheta anuncia apenas Dudu Braga. Aos poucos, ele conquistou o carinho do público e passou a disputar o interesse dos ouvintes que, antes, procuravam o programa apenas para saber histórias de Roberto Carlos.

Fotos: Fabio Braga




Nativa FM - Dudu Braga - 14 anos Nativa São Paulo



POSTS RELACIONADOS:
Enviar um comentário

Comentários