DO TEXTO:
Seria fantástico um show de Roberto Carlos em Joanesburgo
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Para além de outros encontros, nomeadamente o Benfica-Sporting da final da Taça de Portugal na época de 1995 (o tal jogo que vitimou um adepto do Sporting por via do lançamento de um “very light”) e jogos do Santa Clara, participei ainda com Rui Almeida em dois colóquios na ilha do Pico, nos quais também estiveram Alder Dante, João Barnabé, Manuel José, Dr. António Raposo, António Luz e, óbvio, como referi, nós dois. Sempre reconheci em Rui Almeida um “expert” da comunicação, pela sua excelente dicção e, claro, os seus conhecimentos para desenvolver um comentário técnico a contento.
Hoje, portanto, nesta sequência de entrevistas, Rui Almeida, que se encontra a trabalhar na África do Sul, é o nosso convidado.
1 - Você marcou na Antena 1 pelo fato de ter uma excelente dicção e também uma reconhecida capacidade de análise?
RA - Admito que, em 1987, quando cheguei à Antena 1, tenha primado um pouco pela diferença. O ritmo de narração, a preocupação com a forma e o conteúdo da língua portuguesa, a introdução de uma linguagem simultaneamente coloquial e rigorosa, e, creio, também algum conhecimento do meio-rádio e do desporto internacional. É evidente que não serei a melhor pessoa para opinar, mas, com quase 26 anos de carreira, ganhamos uma maturidade e um distanciamento que nos permite analisar tudo de uma forma mais rigorosa e equidistante...
2 – Foi difícil entrar na Antena 1, sabendo-se que na altura existia, para o efeito, muito compadrio?
RA - Eu ainda não tinha terminado o meu curso de jornalismo e fora convidado pelo então chefe do Departamento de Programas Desportivos, o Costa Martins, para integrar a equipa da Antena 1. Creio que as referências de que ele dispunha o fizeram "apostar no escuro"... Fui muito bem recebido. A Antena 1, na altura, era servida por alguns nomes enormes da rádio desportiva portuguesa (António Pedro, David Borges, Fernando Maciel, Óscar Coelho, Gustavo Rosa...), pelo que foi o ponto de partida ideal para complementar os meus estudos em Jornalismo de Rádio. Depois, alguma sorte e algum arrojo em inovar terão feito o resto...
3 – Chegou a sentir, internamente, alguma indiferença por pare dos colegas mais antigos?
RA - Nunca! Pelo contrário! Fui sempre extremamente bem tratado por todos. Quer os nomes que referi na resposta à pergunta anterior, quer pelos restantes companheiros da informação e da programação. Fiz bons amigos, como o Luís Ochôa, o Rui Pedro (já falecido...), o João Paulo Diniz, o Francisco Sena Santos, o Carlos Veríssimo, o Mário Figueiredo, o Adelino Gomes... Nomes fortíssimos da rádio pública no final da década de 80/princípio da década de 90, e dos quais guardo recordações fantásticas, pelo apoio, pelo carinho e, naturalmente, pela grande referência que sempre foram para mim, em termos profissionais.
4 – Bateu com a porta, desiludido com a política seguida na rádio oficial portuguesa?
RA - Saí por duas vezes. A primeira, em meados de 1992, na sequência de um processo pouco transparente de substituição do então responsável pela área desportiva (Costa Martins), substituído, por ação do novo diretor de informação (Hernâni Santos), por um tal António Gonçalves, jornalista sem nenhuma experiência do setor desportivo, das respetivas especificidades, e que, pese toda a boa vontade, era uma absoluta nulidade na condução de uma equipa de profissionais experimentados. Entendi sair, e fui para a Rádio Comercial (onde estive seis meses) e, depois, para Macau, onde passei cerca de um ano. A segunda vez que abandonei a RDP, fi-lo com a consciência de que o meu tempo profissional na rádio pública, naquela altura, se havia esgotado: tinha outros projetos, queria experimentar outras áreas (não apenas do jornalismo, mas também da política e do cinema), e deixei a estação a 29 de fevereiro de 2000. Hoje, mais de onze anos passados, vejo que a maioria dos meus companheiros de então continuam na Antena 1, com um modelo de gestão e de produção idêntico, fazendo as mesmas coisas nos mesmos "tempos", e, olhando para o que fiz, entretanto, fico muito feliz pela opção tomada, que me fez ganhar múltiplas experiências noutras áreas. Se tivesse continuado na rádio pública portuguesa, nunca o teria conseguido...
5- Pelo que se conhece, é um profissional que vive a sua própria profissão, ou seja, não é daqueles que brinca em serviço?
RA - Só se é jornalista se o formos por vocação. Essa é a base da profissão. Depois, virá a formação teórica e prática e, só depois, a experiência (que os mais novos, muitas vezes, não compreendem, mas que se vem a revelar fundamental para um bom desempenho!). Tenho um imenso respeito pelo telespetador, pelo ouvinte, pelo leitor. Seja um ou um milhão. Um único merece o mesmo respeito, o mesmo rigor, a mesma paixão, como se de um milhão de recetores se tratasse. Esse é o segredo (afinal tão simples!...) para se encarar o jornalismo como algo que é transversal à nossa vida. Posso vir a deixar a televisão, a nunca mais colaborar com a rádio ou escrever para imprensa, mas nunca deixarei de ser jornalista...
6 – Há entre si e os Açores existe uma forte ligação, creio que iniciada pelo próprio futebol?
RA - Não foi uma ligação iniciada pelo futebol. Eu sou o único membro da família não açoriano! O meu pai era faialense (da Horta), a minha mãe e a minha irmã são terceirenses (de Angra do Heroísmo), o meu filho, de sete anos, é micaelense (de Ponta Delgada), e a minha noiva (casarei em janeiro do próximo ano) é também micaelense (da Lagoa). Tenho casa em Ponta Delgada, e trabalhei cerca de cinco anos no arquipélago (quatro meses na Horta - no Governo Regional - cerca de três anos em Ponta Delgada - no Santa Clara, como diretor de comunicação, e, depois, como comentador da RTP Açores - e mais de um ano na Madalena do Pico - na Câmara Municipal, como chefe de gabinete do Presidente). Portanto, a minha ligação ao arquipélago começou aos dois anos de idade, quando, pela primeira vez, fui com a família passar férias à Terceira... Creio que muitos dos meus genes são açorianos. Atualmente reparto a minha vida entre a África do Sul e os Açores, e creio que ficarei sempre ligado à região. As ilhas, as cores, os cheiros, o mar, tudo isso é único nos Açores e, portanto, esta é uma ligação de vida que, em determinada altura, também abarcou o futebol, onde, de resto, continuo a manter muitos amigos no arquipélago.
7- O que o levou a sair de Portugal, profissionalmente falando?
RA - Fundamentalmente a vontade de trabalhar com outros métodos, de apreender novas técnicas, de perceber o que de melhor se faz no mundo, no capítulo dos "media". Vivi em Macau, em Madrid, em São Paulo, em Luanda... Agora passo uma parte do ano em Joanesburgo, e continuo a viajar com imensa frequência. Este ano estive na Índia, nos Estados Unidos, no Botswana, no Haiti... Entendo que o mundo é demasiado pequeno para ainda o reduzirmos mais a uma cidade, a um núcleo de pessoas, a uma maneira de viver. Entendo que a nossa riqueza está no que vivemos. Somos o que vivemos. E o que guardamos na memória das nossas experiências. E aplico, à risca, esta máxima na minha vida... No que diz respeito à componente estritamente profissional, Portugal tem ótimos jornalistas, técnicos, produtores, realizadores. Mas que ganhariam muito, pessoal e profissionalmente, se lhes fosse dada a oportunidade de vivenciar outras realidades, outros métodos de trabalho. E o facto de estar, agora, na SuperSport (a segunda maior estação mundial de televisão desportiva, a seguir à norte-americana ESPN) permite-me concluir que as estruturas de "media", em Portugal, poderiam estar muitos passos à frente se soubessem dar as devidas oportunidades aos profissionais que as servem... Lembro-me sempre do Pedro Pinto, que chegou à SportTv vindo da CNN, e que saiu pouco mais de um ano volvido, desencantado, para regressar à estação norte-americana, queixando-se do pouco aproveitamento que lhe foi dado, à sua experiência, aos seus conhecimentos... Em Portugal não há meritocracia. Continua a haver compadrio, amizade, interesse obscuro. Continua a prevalecer uma ampla geração de carreiristas, "lambe-botas", aproveitadores profissionais. Do ponto de vista do país, Portugal, neste momento, não o é: é um holograma...
8 – África do Sul é hoje a sua principal referência?
RA - Indiscutivelmente. Como país é encantador, na sua multiplicidade, em todos os sentidos (racial, tribal, linguístico, paisagístico, climatérico, histórico, cultural, musical). É um país de trabalho, que procura criar uma cultura de excelência e de mérito. É uma economia emergente, integrando os BRICS (com o Brasil, a Rússia, a Índia e a China). Estes cinco países, em conjunto, dentro de vinte, trinta ou quarenta anos, estarão na vanguarda económico/financeira do planeta, imporão as suas regras, e farão as atuais potências (Estados Unidos e União Europeia) ter de rever muitos comportamentos. É um país notável, onde me sinto em casa. Costumo dizer que tenho o melhor dos dois mundos: a África do Sul e os Açores!...
9 – Sentiu dificuldades de adaptação à televisão, sendo hoje um comentarista com estatuto de internacional?
RA - Nenhuma dificuldade! Em primeiro lugar, porque sou profissional, e a exigência que tenho comigo mesmo obriga-me a procurar superar-me a cada dia. Mas, sobretudo, porque a televisão é um mundo fascinante! A linguagem, a postura, a noção de trabalho de equipa (um meio profundamente coletivo, ao contrário da rádio, que pode tornar-se extremamente individual), tudo na televisão estimula um jornalista. Depois, a sorte de estar integrado numa extraordinária estrutura, onde tudo está preparado para nos facilitar o trabalho, para nos fazer dedicar, exclusivamente, às nossas funções. É uma espécie de Real Madrid, de Barcelona, de Manchester United dos "media". Estou com a SuperSport há um ano e meio, e a experiência tem sido, em todos os aspetos, fabulosa!
10 – Pelo que tenho acompanhado no facebook através dos seus comentários; de Portugal só saudades da família e dos seus verdadeiros amigos?
RA - Exatamente! Saudades que vou "matando" muito regularmente (todos os meses, em regra, passo por Lisboa - a minha mãe e a minha irmã vivem na Amadora... - e estou um período em Ponta Delgada). Costumo dizer que devo ser caso único no país, tendo residência nos Açores e trabalhando na África do Sul!... Tento partilhar um pouco da minha experiência quando viajo a Portugal (dei, há alguns meses, uma conferência na Universidade dos Açores, em Ponta Delgada, e estou convidado para orientar um "workshop" no primeiro semestre do próximo ano, na Universidade de Trás-Os-Montes e Alto Douro, em Vila Real), mas, no essencial, procuro passar tempo com a família e com alguns amigos. A Graça (a minha noiva) vive em São Miguel, e é a primeira pessoa a compreender as vicissitudes da minha carreira, mas é, para mim, com o meu filho, uma prioridade absoluta no tempo em que estou nos Açores... Quanto ao resto, Portugal, para mim, é claramente paisagem, neste momento...
11 – O Portal Splish Splash é diferente dos demais porque abarca várias temáticas, mas a música é a principal, com apoio ao Rei Roberto Carlos. Você tem Roberto Carlos na sua lista dos preferidos?
RA - Tenho, claro! Quem não tem?... A Claúdia Leitte é que o define bem: há uma espécie de "luz divina" quando ele entra em palco, uma auréola invisível que o marca, que o protege, que o estimula... Para nós, que o escutamos há décadas, há ainda a mais-valia de uma experiência tranquila, de um olhar doce, que coloca o ouvinte numa cama de nuvens quando canta... Roberto é único!
12 – Quando uma vez escrevi, em termos de paralelo, sobre Marco Paulo e Roberto Carlos, lembro-me que o Rui Almeida comentou (sic) “que não havia comparação possível entre ambos”. Ainda hoje mantém essa mesma opinião?
RA- Evidentemente! Não se pode comparar a "sorte grande" com a "aproximação". Ainda por cima, uma aproximação que não tem nada de comum com a sorte grande. Roberto é Roberto. Marco Paulo é um cantor português de música de qualidade duvidosa, com letras lamechas, de sucesso fácil e de nicho de mercado bem definido. Não há a mínima comparação entre um "senhor do Mundo" e um cantor mundano...
13 – Um show de Roberto Carlos em Joanesburgo seria interessante, uma vez que na África do Sul estão (emigrados) muitos brasileiros e portugueses?
RA - Seria fantástico! Esgotaria em poucas horas! Joanesburgo é um ponto obrigatório nas "tournées" dos principais nomes da música mundial, portanto, espero que Roberto Carlos inclua a África do Sul no seu roteiro. Há espaços fabulosos (o Coca-Cola Dome é o melhor exemplo), há uma ampla comunidade brasileira e, sobretudo, portuguesa, há todas as condições para esgotar um "show" de Roberto Carlos em Joanesburgo!
14 – O Rui passou pelo Brasil algumas vezes. O que perspectiva para o Mundial de Futebol que decorrerá em 2014?
RA - Começo por fazer uma comparação com o Mundial'2010, na África do Sul: uma organização primorosa, em que nada faltou às equipas, aos jornalistas, aos voluntários, aos adeptos. Mas, tirando as "Fan Fests" da FIFA, faltou festa de rua. No Brasil, teremos o "Mundial do povo"! Nas doze cidades haverá festa permanente, samba, batuque, ritmo, cor, alegria, caipirinha, chopinho, churrasco, convívio! Nesse particular, será o melhor "Mundial" de sempre, não tenho dúvidas! Em termos organizativos, sei que, na altura certa, nada falhará. Acredito no Brasil, nos brasileiros, acredito na sua vontade e na sua competência. Mas convém não brincar com o fogo, porque o "Mundial" é já amanhã, e há ainda muitos atrasos em investimentos estruturantes para o sucesso da competição!... Mas lá estarei, seguro de que irei participar no melhor campeonato do Mundo da história!
15 – Dos cantores brasileiros que conhece qual o que gostaria que interpretasse o hino desse mesmo mundial?
RA - Qualquer coisa que reunisse Ivete Sangalo, Caetano Veloso, Gadú, Cláudia Leitte... Com Roberto Carlos, os meus preferidos no Brasil!
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Comentários
Para quem, como eu, gostaria de ser jornalista quando fosse grande, esta entrevista de Carlos Alberto Alves a Rui Almeida é, no meu ponto de vista, o protótipo da arte de ser jornalista.
ResponderEliminarComo administrador do Splish Splash e admirador incondicional do entrevistador, poderia ser suspeito se dele falasse. Porém, relativamente ao entrevistado e no que a esta entrevista se refere, estou à-vontade para manifestar o meu agrado no que se refere às respostas que deu às perguntas que lhe foram colocadas. E, neste aspecto, fã incondicional que sou do cantor/compositor Roberto Carlos, desta vez não posso evitar o epíteto de “suspeito” já que, da entrevista, não posso deixar de realçar a seguinte pergunta e respectiva resposta:
(..) Você tem Roberto Carlos na sua lista dos preferidos?
RA - Tenho, claro! Quem não tem?... A Claúdia Leitte é que o define bem: há uma espécie de "luz divina" quando ele entra em palco, uma auréola invisível que o marca, que o protege, que o estimula... Para nós, que o escutamos há décadas, há ainda a mais-valia de uma experiência tranquila, de um olhar doce, que coloca o ouvinte numa cama de nuvens quando canta... Roberto é único!
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Quando eu for grande quero ser jornalista!
Olá Carlos Alberto!
ResponderEliminarParabéns pela excelente entrevista!
Gostei, mas gostei mais quando ele fala do NMQT, Roberto Carlos.
Você tem Roberto Carlos na sua lista dos preferidos?
RA - Tenho, claro! Quem não tem?...
Isso é muito bom de ler, de ouvir, de falar.
E Realmente ele é ùnico!
Um abraço,
Carmen Augusta
Grande jornalista e comendador. Deliro com os seus relatos , espetacular mesmo
ResponderEliminarGrande comentador, deliro com os seus relatos de futebol. Simplesmente fantástico.
ResponderEliminarUma pergunta ao RuibAlmeida. A tecnologia ultimamente permite fazer os relatos de futebol na televisão, apartr de casa? Sou moçambicano e como sabe temos quatro jovens na equipe.
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