Do Oeste Paulista ao Velho Oeste, a mesma lógica de ocupação que moldou nações
Dois lados de um continente, um mesmo mito fundado
Por: Henrique A. Chagas*
A conquista do chamado Oeste paulista e a do Oeste americano nasceram de sonhos parecidos: fé, destino e expansão. Em ambos os lados do continente, o território “vazio” foi o argumento moral para a ocupação e a violência. O resultado foi semelhante — povos originários expulsos, rios desviados, matas arrasadas e um imaginário nacional construído sobre o mito da conquista.
A partir de 1850, o interior de São Paulo tornou-se palco daquilo que o Império chamava de “civilização do sertão”. O fim das sesmarias e a Lei de Terras abriram caminho para o domínio. A espada dos bugreiros, a catequese dos capuchinhos e a caneta dos cartórios e os grileiros completaram o trabalho. Os Botocudos e Caiuás, como os Sioux ou os Cheyenne, foram retratados como obstáculos à modernidade.
Nos Estados Unidos, a doutrina do Destino Manifesto justificava: o direito divino de ocupar e explorar. No Brasil, a retórica era outra, mas a lógica, a mesma — uma missão civilizadora, movida por lucro, medo e fé. Os dois “Oestes” criaram seus próprios mitos fundadores: o cowboy e o bandeirante. Ambos inventaram heróis para encobrir suas sombras.
A série Yellowstone, fenômeno global, revisita esse imaginário com rara franqueza. Mostra que a fronteira nunca acabou: ela apenas mudou de rosto. Os conflitos por terra, água e pertencimento continuam, agora entre empresários, povos nativos e o próprio Estado.
No Brasil, o Oeste Paulista vive uma versão silenciosa do mesmo enredo. A monocultura substituiu a mata; o agronegócio, o coronel; e o progresso, a promessa. Mas as feridas permanecem. O sertão ainda arde sob o asfalto, e o país, como os Dutton de Yellowstone, continua lutando para sustentar uma ideia de posse que o próprio tempo já desmente.
Entre o faroeste e o sertão, há menos distância do que parece. Ambos nasceram da crença de que conquistar é o mesmo que existir — e ambos ainda buscam, no fundo, a coragem de devolver a terra à sua própria verdade.
Nota do Editor - Portal Splish Splash:
Este artigo do escritor Henrique A. Chagas oferece uma reflexão fundamental sobre as origens de conflitos atuais, mostrando como o passado nos ajuda a decifrar o presente.
*Henrique A. Chagas é escritor, genealogista e autor do livro “Tavares Terra – A diáspora mineira, os Tavares Terra e José Theodoro de Souza no sertão paulista”. Formado em Direito, estudou Psicologia e Filosofia, foi coordenador jurídico da Caixa Econômica Federal e atualmente dirige uma organização social que atende pessoas com deficiência visual na região de Presidente Prudente (SP).
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Do Oeste Paulista ao Velho Oeste, a mesma lógica de ocupação que moldou nações
Redatora Permanente do luso-brasileiro Portal Splish Splash. Uma sonhadora que acredita no verdadeiro amor, no romantismo e na felicidade, que carrega a fé em cada detalhe da vida. VER PERFIL
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