Endometriose: estudo revela nova peça no quebra-cabeça da principal causa de infertilidade feminina

Os pesquisadores descobriram que a endometriose pode estar relacionada a infecções por um grupo específico de bactérias conhecido como...

Mulher com as mãos no ventre.

 

Grupo de bactérias pode estar associado ao desenvolvimento da endometriose


Segundo estudo publicado no periódico Science Translational Medicine, que também apontou o uso de antibióticos como uma abordagem eficaz no tratamento da condição


Destaques:

* Estudo mostrou que pessoas com endometriose são mais propensas a hospedar bactérias do gênero Fusobacterium.
* Essa é uma nova teoria para o desenvolvimento da doença, que até então era relacionada à menstruação retrógada.
* Experimentos em camundongos mostraram que antibióticos podem reduzir tamanho e número das lesões endometriais.

São Paulo – 11/07/2023 - Estima-se que uma em cada 10 mulheres brasileiras sofrem com endometriose atualmente, de acordo com dados do Ministério da Saúde. Causa de infertilidade e dor pélvica severa, a endometriose, infelizmente, ainda tem causa desconhecida e, logo, não tem cura, com as opções de tratamento, que são limitadas, servindo para aliviar os sintomas e controlar a doença. Mas uma  descoberta publicada em junho no periódico Science Translational Medicine
pode revolucionar esse cenário: “Os pesquisadores descobriram que a endometriose pode estar relacionada a infecções por um grupo específico de bactérias conhecido como Fusobacterium. Essas bactérias comensais podem ser encontradas, por exemplo, na cavidade oral, no intestino e no trato vaginal e já foram associadas a outros tipos de doenças, como gengivite e periodontite”, explica o Dr. Fernando Prado*, especialista em Reprodução Humana, Membro da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM) e diretor clínico da Neo Vita.

Até hoje, a teoria mais aceita para explicar o desenvolvimento da endometriose é a da menstruação retrógada, definida em 1927 pelo ginecologista John Sampson, que, após quase 100 anos, ainda não foi provado errado. “A teoria da menstruação retrógada diz que a endometriose ocorre quando as células do endométrio, mucosa que reveste a parede do útero, não são devidamente expelidas durante a menstruação, apresentando um ‘fluxo retrógrado’ através das tubas (trompas) uterinas e se espalhando pelo aparelho reprodutivo e até mesmo por outras regiões como intestino, apêndice e bexiga”, explica o Dr. Fernando Prado. O presente estudo propõe, então, uma possível nova maneira de se pensar e tratar a condição.

Para o estudo, os pesquisadores analisaram o tecido endometrial de 155 mulheres japonesas com e sem endometriose e observaram que 64% das pacientes com a doença apresentavam bactérias do gênero Fusobacterium, contra 7% daquelas que não possuíam a condição. Além disso, para verificar se esses microrganismos poderiam afetar diretamente o curso da endometriose, os cientistas transplantaram tecido endometrial de um grupo de camundongos para a cavidade abdominal de outro grupo. Em semanas, lesões endometriais se formaram nos animais receptores. Assim, verificou-se que as lesões da doenças tendem a ser maiores e mais abundantes em camundongos inoculados com Fusobacterium.

A descoberta permite que novas abordagens terapêuticas sejam estudadas no tratamento da doença. “Hoje, a endometriose pode ser tratada com de terapia hormonal para controle do quadro e intervenção cirúrgica para remoção das lesões”, detalha o médico. A equipe responsável pelo estudo, inclusive, tratou os camundongos utilizando antibióticos (metronidazol e cloranfenicol) com administração vaginal, o que se mostrou eficaz na redução do tamanho e número das lesões da doença. “O tratamento com antibióticos seria extremamente benéfico para ajudar as mulheres que sofrem com dor severa devido à condição e também aquelas que desejam engravidar, visto que, na endometriose, as células do endométrio se espalham pelo aparelho reprodutivo, dificultando desde a fertilização do óvulo até a implantação do embrião, com consequente prejuízo a fertilidade”, destaca o Dr. Fernando. No entanto, ainda são necessários testes para verificar se os antibióticos seriam capazes de aliviar os sintomas em mulheres, o que já está sendo realizado pelos cientistas.

Além disso, é importante ressaltar que o estudo possui limitações, como a amostra restrita a mulheres japonesas. Mas os pesquisadores estão trabalhando para criar um repositório de amostras mais diverso em etnias e gêneros. “Mais pesquisas sobre o tema são então necessárias, principalmente pelo fato de os camundongos servirem apenas como modelos da condição, já que não menstruam ou formam espontaneamente lesões endometriais. Além disso, enquanto o estudo com camundongos é focado em lesões nos óvarios, em humanos essas lesões podem ser formadas em diversos locais do corpo, inclusive na bexiga e no cólon. Até lá, para essa paciente que sofre com a doença, o melhor é consultar um ginecologista, que poderá indicar o melhor tratamento para cada caso entre as opções disponíveis hoje. E, caso haja o desejo de engravidar, o ideal é buscar por um especialista em reprodução humana”, finaliza.

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*DR. FERNANDO PRADO: Médico ginecologista, obstetra e especialista em Reprodução Humana. É diretor clínico da Neo Vita e coordenador médico da Embriológica. Doutor pela Universidade Federal de São Paulo e pelo Imperial College London, de Londres - Reino Unido. Possui graduação em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo, Membro da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM) e da Sociedade Europeia de Reprodução Humana (ESHRE). Instagram: @neovita.br
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