Falta de uma conexão genética não interfere no vínculo de famílias criadas a partir de gravidez por barriga solidária ou doação de óvulos e sêmen
São Paulo – 14/06/2023 - Estima-se que, no mundo, mais de 8 milhões de crianças foram concebidas por meio de tecnologias de reprodução assistida. E, com o avanço das pesquisas na área, esses procedimentos têm se tornado cada vez mais eficazes e populares. No entanto, ainda existe muita discussão sobre a saúde a longo prazo de crianças concebidas por meio desses tratamentos, já que, por serem tecnologias recentes, o conhecimento sobre o assunto ainda é limitado. Mas, agora, um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Cambridge e publicado em abril no periódico Developmental Psychology mostrou que a gravidez por doação de gametas ou barriga solidária não tem impacto no bem-estar psicológico da criança ou nas relações familiares em comparação com crianças concebidas naturalmente. “O desejo de ter filhos parece superar qualquer questão relacionada aos tratamentos de reprodução assistida. E isso é o que realmente importa”, diz o Dr. Fernando Prado*, especialista em Reprodução Humana, Membro da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM) e diretor clínico da Neo Vita.
Esse é o primeiro estudo a examinar os efeitos a longo prazo da reprodução com doação de gametas ou barriga solidária na saúde psicológica das crianças e nas relações familiares. Para isso, os pesquisadores acompanharam, por 20 anos, 65 famílias britânicas com filhos concebidos por meio de barriga solidária, doação de óvulos ou doação de sêmen. Esse grupo foi comparado com 52 famílias que tiveram filhos de maneira natural. Com isso, foi possível concluir que a falta de uma conexão genética entre pais e filhos não interfere nas relações familiares ou no bem-estar emocional dessas crianças no futuro. “O estudo derruba a suposição de que crianças nascidas por reprodução assistida com doação de gametas ou barriga solidária estão em desvantagem quando se trata do vínculo familiar simplesmente pela falta de uma conexão genética com os pais”,diz o especialista em Reprodução Humana.
O estudo é também o primeiro a investigar o impacto que a descoberta desses tratamentos tem nas crianças dependendo da idade em que são informadas sobre o assunto. Os pesquisadores relataram, por exemplo, que mães que contaram às crianças sobre sua origem biológica no período pré-escolar apresentavam uma relação mais positiva com seus filhos e menores níveis de ansiedade e depressão. Também, os jovens adultos concebidos por meio de reprodução assistida que souberem de sua origem por volta dos sete anos de idade conquistaram melhores resultados em um questionário sobre aceitação parental, comunicação familiar e bem-estar psicológico, além de reportarem menos problemas na relação familiar em comparação com os indivíduos que descobriram sobre sua concepção após os sete anos.“Isso sugere que existe um efeito positivo em ser sincero com as crianças sobre sua concepção enquanto ainda são jovens, preferencialmente antes de entrarem na escola. É algo bastante similar ao que também foi demonstrado por estudos com famílias adotivas”, afirma o Dr. Fernando Prado.
Os pesquisadores ainda descobriram que mães por doação de óvulos reportaram relações familiares menos positivas que mães por doação de sêmen, o que, no entanto, não refletiu na percepção dos filhos sobre a qualidade dessa relação. “É possível que esse fato esteja relacionado a inseguranças maternas causadas pela ausência de uma conexão genética com seus filhos”, pondera o médico. O estudo também demonstrou que jovens adultos concebidos a partir de doação de sêmen reportaram uma pior comunicação familiar em comparação com aqueles concebidos por meio de doação de óvulos. Além disso, apenas 42% dos filhos gerados por doação de sêmen sabiam desse fato aos 20 anos, contra 88% das crianças concebidas por doação de óvulos e 100% daqueles gestados por barriga solidária. “A explicação pode ser o maior sigilo que envolve a doação de sêmen,que muitas vezes não é revelada aos filhos. Além disso, mesmo quando é revelada, existe uma maior relutância em falar sobre o assunto”, destaca o especialista.
Atualmente, o estudo pode parecer ordinário dada a quantidade de casais que conquistaram o sonho de iniciar uma família através da reprodução assistida, mas há 20 anos, quando a pesquisa foi iniciada, a visão sobre esse tipo de família era diferente, pois se pensava que, sem uma conexão genética, as relações familiares não funcionariam. E, ainda hoje, a pesquisa mostra-se de grande relevância visto que as informações sobre saúde mental de pessoas concebidas a partir de tratamentos de reprodução humana são escassas. “Além disso, o estudo também pode encorajar que mais casais inférteis optem pelos tratamentos de reprodução assistida como meio de gerar um filho e começar uma família”, finaliza o Dr. Fernando Prado.
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DR. FERNANDO PRADO - Médico ginecologista, obstetra e especialista em Reprodução Humana. É diretor clínico da Neo Vita e coordenador médico da Embriológica. Doutor pela Universidade Federal de São Paulo e pelo Imperial College London, de Londres - Reino Unido. Possui graduação em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo, Membro da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM) e da Sociedade Europeia de Reprodução Humana (ESHRE). Instagram: @neovita.br
Falta de uma conexão genética não interfere no vínculo de famílias criadas a partir de gravidez por barriga solidária ou doação de óvulos e sêmen
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