Alunos aprendem matemática com truques de mágica no interior de SP

DO TEXTO:
Alunos de escola em Campinas aprendem matemática com truques de mágica

LUÍS FREITAS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM CAMPINAS


Uma grande tabela com figuras numeradas é pendurada na sala. A "apresentadora" Leila Graziela Mendonça e Castro, 37, escolhe um voluntário e ordena: "Pense em um número com dois algarismos e maior que dez. Agora, some os dois números. Pegue o resultado e o subtraia do número que você escolheu. Pronto?". Sem muita segurança, o voluntário assente.

Leila então pede para ele encontrar a imagem correspondente ao resultado na tabela -supostamente, só ele sabe que é um trevo de quatro folhas. Ela diz, com ar triunfal: "Está com sorte hoje, hein?", deixando o voluntário um tanto quanto incrédulo.

Poderia ser apenas um espetáculo de mágica, se a apresentadora não fosse uma professora e, a plateia, formada por estudantes do ensino médio da escola estadual Djalma Octaviano, no Jardim Pauliceia, em Campinas. De mágica, a encenação também não tem nada: é pura matemática.

A "mágica" das figuras é fácil de explicar: ao somar dois algarismos de um mesmo número, e subtrair o resultado do número original, os resultados sempre serão múltiplos de nove -que, na tabela, vêm acompanhados do trevo de quatro folhas.

Além desse truque, outros são usados para explicar sistema binário (com cartas do baralho) e ternário (em que a professora "adivinhava" o número escolhido em uma tabela com algarismos de 1 a 80).
Matemática com truques de mágica

Foi essa a forma que Leila e a colega Cláudia Di Risio, 49, professora de português, encontraram para aproximar o conteúdo dos alunos, em uma disciplina eletiva lecionada durante todo o ano passado.
A escola estadual, com 220 estudantes, é em período integral -há 545 no Estado. Depois de cada truque, os alunos se reúnem em grupos e produzem uma pequena encenação -é aí que entra a professora de português.

As disciplinas eletivas, como a Circo Matemática, são opcionais, semanais e têm conteúdo definido pelos próprios estudantes. Em 2016, 30 deles acompanharam as atividades de Leila e Cláudia que, diante do sucesso, podem ser retomadas no próximo semestre.

Leila teve a ideia de adotar o modelo após um curso de aperfeiçoamento, pago pelo Estado, em Aveiro (Portugal), em 2014. Lá, parte dos professores tinha um grupo de circo e usava as artes cênicas nas aulas. Chamou Cláudia e criaram a disciplina.

Contaram com o apoio dos estudantes e da comunidade, vendendo pizzas e pastéis em eventos da escola, para arrecadar cerca de R$ 700 e comprar o material usado nas aulas, como fantasias e cartazes.

Atividades como as desenvolvidas pela dupla têm dado bons resultados. Em 2013, a escola Djalma Octaviano teve média de 1,13 no Idesp -avaliação estadual. No ano passado, o índice passou para 4,75, perto da meta estipulada pelo governo para 2030 -5.

Mas Leila e Cláudia fazem questão de ressaltar que a "culpa" não é só delas. "É uma escola muito boa de trabalhar", diz Leila.

Os alunos atestam. Laura Baccetto Ajalo, 16, está no terceiro ano e entrou na escola no ano passado, vinda da rede particular. "A mudança foi um presente de Deus", afirmou. Ela, que já gostava de matemática e quer fazer engenharia civil, passou pelas aulas de Leila e Cláudia. "Me ajudou muito para dar mais rapidez na hora de fazer cálculos de cabeça", diz.

O modelo de ensino integral foi adotado pelo governo paulista em 2012. Há aulas de manhã e à tarde, para aproximar mais o estudante e a comunidade da escola.

Profissionais do sistema têm um salário 75% maior. E os professores se empenham para criar um tipo de relação diferente com o aluno.

"Sentimos que os alunos se esforçam para tirar notas boas porque gostam da gente. E pedem desculpa quando vão mal", diz Cláudia. Alguns, já na universidade, pedem ajuda aos antigos professores para fazer trabalhos.

Um exemplo é Leonardo de Souza Oliveira, 18, que cursa ciências contábeis em uma universidade particular de Campinas. A pedido de Leila, ele acompanhou o encontro com a Folha na quinta (6).

"Não é que eu sou puxa-saco [risos], mas as aulas foram muito legais. Hoje, na faculdade, vejo que algumas aulas são difíceis de acompanhar porque os professores seguem velhas fórmulas", diz. 

Fotos: Karime Xavier/Folhapress


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