Roberto Carlos tem obra abordada pelo saxofonista Zé Canuto em disco que soa como se Kenny G tocasse hits do 'Rei'

DO TEXTO:

Por Mauro Ferreira, G1

Já imaginou um disco em que o saxofonista Kenny G soprasse as melodias românticas do cancioneiro de Roberto Carlos e Erasmo Carlos no estilo melífluo que tornou o músico norte-americano um popstar nas décadas de 1980 e 1990?

Esse disco nunca foi gravado. Mas certamente soaria similar a Dom, álbum que o saxofonista fluminense Zé Canuto está lançando em edição independente com abordagens instrumentais de dez músicas da obra fundamental da dupla de compositores.

Adoçado com os teclados e as cordas sintetizadas por Tutuca Borba em regravações de músicas como Eu preciso de você (1981) e Amada amante (1981), o álbum Dom é tributo excessivamente reverente à obra de Roberto & Erasmo. Aos ouvidos do público fiel do Rei, tão conservador quanto o artista que entroniza há mais de 50 anos na preferência popular, o disco de Canuto soará como mel.

Capa do álbum 'Dom', do saxofonista Zé Canuto — Foto: Gustavo Paixão

Tal conservadorismo jamais depõe contra o virtuoso saxofonista, mas indica o caminho seguro seguido pelo músico no disco gravado com os toques de outros virtuoses como o pianista Cristovão Bastos, o guitarrista João Gaspar e o violonista João Lyra.

A seleção de repertório tampouco soa ousada, embora inclua músicas menos batidas do cancioneiro de Roberto, casos sobretudo de Na paz do seu sorriso (1979) – faixa aditivada com vocais ao fim da gravação – e de Rotina (1973).

É como um Kenny G tupiniquim que Canuto serve Café da manhã (1978) e que sopra Lady Laura (1978), música que sobra no repertório por ser tema essencialmente pessoal composto por Roberto com Erasmo para reverenciar a própria mãe, Laura Moreira Braga (1914 – 2010).

Em Amante à moda antiga (1980), o sopro sonoro do sax alto de Canuto insinua suingue jazzy sem transgredir a aura tradicionalista que envolve o disco. Que peca sobretudo pelo uso das adocicadas cordas sintetizadas pelo tecladista Tutuca Borba em músicas como As flores do jardim da nossa casa (1969), canção tocada por Canuto sem a melancolia embutida neste tema composto por Roberto quando o então pequeno filho do cantor, Dudu Braga, começou a enfrentar sérios problemas de visão.

No fim, Despedida (1974) – canção gravada com o toque do acordeom de Chico Chagas – e o black soul roqueiro Todos estão surdos (1971), introduzido por vocais de tom kitsch, confirmam a recorrente impressão de que Zé Canuto toca Roberto Carlos como se fosse Kenny G. O que certamente contribuirá para que o disco seja bem recebido pelos súditos do Rei. (Cotação: * * 1/2)


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