Vozes do Fado. Da Gaiola Dourada saiu uma homenagem a Amália

DO TEXTO:


Ruben Alves é agora director artístico de um disco que até põe Bonga a cantar fados de Amália.

 Ana Moura, Bonga e Branko. A mistura de géneros não podia ser mais explosiva, mais ainda se dissermos que o motivo deste encontro improvável a três é a música popular “Valentim”, de Amália Rodrigues. “ É um malhão, uma canção popular, que a Amália gostava tanto de cantar – e aliás foi a primeira a inclui-la em espectáculos”, conta Ruben Alves. O seu nome, tal como o de Bonga e Branko, também não está relacionado com o fado, antes com o cinema, principalmente depois do seu grande êxito, “A Gaiola Dourada”, o filme mais visto em Portugal, em 2013, com um retrato dos emigrantes portugueses em França.

 É a ele que se deve este dueto improvável (Ana Moura + Bonga, melhor só com Prince há uns anos no Meco), ao qual se juntou Branko, dos Buraka Som Sistema, naquela que provavelmente é “a canção mais fora e que pode surpreender mais” do disco. “Pensámos no Branko porque poderia ser interessante ver como, em 2015, um produtor que faz electro se podia adaptar ao fado de folclore, com o lado africano à mistura”, explica. Despreocupações e experiências laboratoriais de quem não se move habitualmente no meio do fado e por isso não está cheio de “receios de fazer isto ou aquilo nem preconceitos em pegar em certas músicas”.

 Aliás, talvez por isso tenha sido ele o escolhido pela Universal francesa para dirigir “Amália: As Vozes do Fado”, esta homenagem à cantora feita “pela nova geração”, que até pôs um street artist agarrado às pedras da calçada numa praça escondida em Alfama.

 “Tudo partiu de uma conversa vulgar com um produtor francês, há três anos”, conta. “Ele ficou com isso na cabeça, falou com a Universal, eles gostaram da ideia e deram-me a direcção artística deste CD, que eu aceitei com a condição de me darem carta branca para fazer o que quisesse.” Fazer o que quer implica elaborar uma lista de – por acaso, “e tal como as colinas” – sete fadistas que habitualmente costumava ouvir em discos ou em casas de fado.

 A NOVA GERAÇÃO E O Medinho Ana Moura, António Zambujo, Carminho, Camané, Gisela João, Ricardo Ribeiro e Celeste Rodrigues aceitaram o convite, embora sem esconder o peso da responsabilidade e talvez “até um medinho”.
 Tudo ultrapassado e a maior parte dos temas do disco, que chega às lojas a 17 de Julho (já está disponível para pré-venda no iTunes), foram escolhidos por Ruben. “Por exemplo, a Celeste Rodrigues [a irmã mais nova de Amália e a única que foge à nova geração] a cantar ‘Faz-me Pena’”, conta. “É um tema que descobri há um ou dois anos, um fado de despedida muito bonito, que a Amália nunca gravou e que achei interessante. A Celeste não queria cantar porque é muito optimista e muito alegre, mas acabou por aceitar.

” Também há Carminho e Caetano Veloso, “que adorava a Amália”, em “Naufrágio”, gravado num estúdio no Rio de Janeiro, e a cabo-verdiana Mayra Andrade, que se juntou a António Zambujo para “Lisboa Não Sejas Francesa”. “Uma frescura”, diz Ruben. Ou “Estranha Forma de Vida”, só com Zambujo, “super intimista, um bombom”.

 E se havia artistas com preconceitos em pegar em “Grito”, Ruben tentou acabar com isso quando ofereceu o tema a Ricardo Ribeiro. “Há muita gente que diz que tem de se ter muito cuidado a cantar o ‘Grito’, mas até ouvi a Celeste Rodrigues dizer que achou maravilhoso o tema do Ricardo.”

 PEDRAS DA CALÇADA Para a capa do disco, e porque o fado, tal como a arte urbana, “sempre foi uma maneira de nos exprimirmos que nasceu nas ruas, a partir do povo”, decidiu chamar o artista Alexandre Farto, mais conhecido por Vhils e pelas suas intervenções de caras gravadas em paredes.

 “Ele teve a ideia de fazer isto em calçada, por cima de Alfama, numa pequena praça que ainda não tem nome [e que pode vir a chamar-se Praça Amália Rodrigues].” No trabalho, intitulado “Calçada”, Vhils colaborou com os calceteiros da câmara de Lisboa e com a Escola de Calceteiros de Lisboa para aquela que é a nova grande atracção turística do Verão. “Há bocado estava lá a fazer uma sessão fotográfica e já havia uma fila de dez pessoas à espera para tirar fotografias”, diz Ruben Alves.

 As gravações do disco, que tiveram direito a um making of promocional, inspiraram um projecto ainda mais ambicioso, “uma vontade” sua. “Já que ia mergulhar no fado decidi fazer um documentário de uma forma muito urbana que não tem nada a ver com o disco, mas que partiu daí”, esclarece. O filme, que ainda está em gravações – e é até provável que encontre a equipa de filmagens por esses cantos recônditos da cidade –, deverá ser exibido na TVI até ao fim do ano.

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