Portugueses pariram a lusofonia

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Por: Carlos Alberto Alves
jornalistaalves@hotmail.com 
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O livro da reputada jornalista brasileira Ângela Dutra de Menezes, num tom entre o humor e a seriedade tenta partilhar com o leitor a visão brasileira sobre a história dos portugueses, onde é possível concluir que o Brasil de hoje é Portugal no seu sentido mais literal. Partilho a propósito de uma tertúlia em que participei em tempos idos, com o sugestivo título “Como os imigrantes vêem Portugal e os portugueses”. Assim, começo com quatro notas prévias. A forma como vemos o outro resulta sempre das nossas vivências individuais. A segunda nota, e decorrente da primeira, é que é sempre complicado generalizar esse olhar sobre o outro, pecando tanto por defeito como por excesso. A terceira é que quando nós olhamos o outro o fazemos também com base nos nossos próprios preconceitos e estereótipos. A quarta nota resume os

 

três pontos anteriores e tem a ver com o palavrão: “identidade de um povo”. A Sociologia ensina-nos que a identidade é construída com base, muitas vezes, em pressupostos e estereótipos que temos sobre nós próprios e que se vão alterando com o tempo. Lembro-me, por exemplo, da saudade. Antes de vir para o Brasil tinha a plena convicção de que a “saudade” era um termo exclusivo dos africanos, em função do que constatei nos dois anos em que permaneci em Angola. Treta! Vim descobrir, afinal, que os portugueses reivindicam essa exclusividade - e com toda a legitimidade, diga-se. Conclusão disto tudo: a saudade afinal não é só portuguesa ou de exclusiva pertença dos cabo-verdianos, angolanos, moçambicanos, guineenses, etc.. Mas adiante… O que pensam os imigrantes sobre os portugueses? A pouca valorização do que é nacional, do que é português. Há uma tendência na sociedade portuguesa para renegar o que é nacional, o que converge, de resto, com uma política muito pouco criativa no sentido de inverter esta tendência, a par de inúmeras críticas gratuitas sobre o que é feito por estas bandas. A relação esquisita e paranóica com os títulos. Todos nós somos “Drs.” e “Dras.” de alguma coisa há quem se ofenda se a carta não for com o tal” Dr.” e prevalecem tratamentos diferenciados em função do tal” Dr.”. Espero que, face à massificação do ensino superior, Portugal deixe um dia de lado essa mania dos títulos que, na maioria dos casos, só atrapalham. Uma outra coisa tem a ver como uma sociedade que está, infelizmente, ancorada nas “cunhas” e não na valorização do mérito. É muito difícil subir na sociedade portuguesa com base no mérito e na competência, sendo que o factor “cunha” está a ter um papel cada vez mais relevante. Atenção: isto não quer dizer que não exista, até com maior grau, noutros locais. Como foi o português que pariu os africanos, é bem possível que o factor “cunha” tenha graus ainda mais preocupantes noutras latitudes. Quando comparamos a expressão do racismo em Portugal com as restantes sociedades europeias é plausível dizer que as coisas funcionam de forma mais subtil porventura mais descontraídas, mas ele não deixa de estar lá. Tudo é mau? Claro que não. Os portugueses são um povo acolhedor, solidário e com uma capacidade de “desenrasque” fantástica. Volto ao título, ou seja, como os lusófonos foram paridos por portugueses, acabamos, com maior ou menor intensidade, por carregar esses aspectos da alma lusa. Como Portugal precisa de “levantar o astral”, fica um trecho da Ângela de Menezes: “Os portugueses andaram no mundo inteiro. Um país pequeno, na Ponta da Europa, habitada por meia dúzia de gatos-pingados, realizou a proeza de ser o dono do mundo. É de se lhe tirar o chapéu”.

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