Eu sou um negro gato'

DO TEXTO:

Autor de sucessos, Getúlio Côrtes estreia em CD aos 80 anos

 RAPHAEL VIDIGAL

Era como no título de um filme com direção do cineasta tcheco Milos Forman e estrelado por Jack Nicholson em 1975 que Getúlio Côrtes se sentia no bairro de Madureira, sede das escolas de samba Portela e Império Serrano, onde ele foi “nascido e criado”, de acordo com as próprias palavras. Homenageado na quadra da agremiação de Dona Ivone Lara em 2008, o músico repete a expressão. “Tenho vários amigos lá, até me chamaram para ser da ala dos compositores, mas eu seria ‘um estranho no ninho’, porque optei pelo rock”, informa.


O disco que ele lança no próximo dia 29 de março no Teatro Ipanema confirma a tese. Uma semana antes, Côrtes celebra oito décadas de vida com uma apresentação no lendário Beco das Garrafas, no dia de seu aniversário. Mas os mais curiosos já podem conferir a faixa “Por Motivo de Força Maior”, disponibilizada na internet. Acompanhado por músicos da nova geração como Marcello Calado, Melvin e Benjão, Côrtes apresenta uma versão ainda mais roqueira do clássico gravado por Roberto Carlos em 76.


“Queria que fosse um disco diferente, com novas roupagens, e uma banda forte de baixo, bateria, teclado e guitarra”, declara. O inusitado da situação é que com uma gama de sucessos do porte de “Negro Gato”, “Quase Fui Lhe Procurar”, “Atitudes”, “Pega Ladrão”, “O Tempo Vai Apagar” e outros, só agora ele estreia em disco. O batismo “As Histórias de Getúlio Côrtes”, vem para sublinhar o estilo de composição do cantor. “Todas as minhas músicas são baseadas em histórias reais que eu conto, daí a ideia do nome”, diz.


A mais famosa delas mistura a observação de uma personagem com a própria personalidade. Lançada pelo conjunto Renato e Seus Blue Caps em 64 e revisitada com êxito por Roberto Carlos, Luiz Melodia e Marisa Monte, “Negro Gato” é fruto de duplo incômodo. “O negro gato existiu mesmo. Era um gato que não me deixava dormir, ficava no telhado de zinco do meu barraco e toda noite me perturbava. E ele ficava me olhando, encarando. Pensei: ‘um dia isso vai me dar um retorno’. Mas demorou muito para vir a inspiração, foi quase um mês até ficar pronta essa música”, revela o compositor. “É também um pouco a minha história, porque eu sempre fui um cara sem recursos (econômicos), então misturei as duas coisas”, completa.


Trajetória. Para selecionar as dez canções que integram o álbum, Côrtes contou com as parcerias do músico e produtor André Paixão e de Marcelo Fróes, dono do selo Discobertas, que lança o trabalho. “Queria gravar um disco, mas nunca tive quem me incentivasse. O Marcelo (Fróes) é um cara que pesquisa música brasileira e me fez o convite. Casou a fome com a vontade de comer”, brinca. Reconhecido no campo da autoria, ele se inspirou no cinema para criar o primeiro hit. “Noite de Terror” foi um pedido especial do então rei da Jovem Guarda.


“Gostava muito de filmes do Drácula e histórias em quadrinhos do Frankestein. Quando o Roberto (Carlos) me disse que queria uma coisa diferente, porque só mostravam para ele canções parecidas, eu não tive dúvidas, e criei esse rock”, relembra. Foi a senha para uma relação particular com o intérprete, que ainda colocou sua voz a serviço de “O Feio”, “O Gênio”, “Uma Palavra Amiga” e muitas mais. Ainda hoje, Côrtes é o único a ter duas canções editadas num mesmo disco de Roberto, no caso, em 1966, com “Negro Gato” e “O Gênio”. Apesar disso, ele não teve a mesma sorte de colegas do movimento que trazia Wanderléa e Erasmo Carlos.

“Naquela época tinha racismo, sim, mas na música nunca tive nenhum episódio que me deixasse chateado. Há uma filtragem do negro que ainda persiste. Eu fui comerciário e tinha muita dificuldade para arrumar emprego, escolhiam as pessoas mais claras”, lamenta. Irmão do também músico Gerson King Combo, que ganhou o apelido musical graças a ele, Côrtes não tem dúvidas sobre quem gostaria de ouvir cantando uma música sua. “Djavan”, entrega.

Repertório
1. “Eu Preciso Ser Feliz”
2. “Negro Gato”
3. “Hei Você” 
4. “Eu Só Tenho um Caminho”
5. “Quase Fui Lhe Procurar”
6. “Ponha no Lugar”
7. “Cada um Dá o Que Tem”
8. “Por Motivo de Força Maior”
9. “O Tempo Vai Apagar” 
10. “Atitudes”

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