'Projeto de mãe' ensina fotografia a jovens com síndrome de Down

DO TEXTO:
Alunos posam em estúdio; iniciativa é de fotógrafa, mãe de rapaz com síndrome de Down

STELA MASSON
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Ao manejar câmeras e lentes em lugares públicos, o jovem com síndrome de Down Felipe Reis, 24, passou a chamar a atenção de pais de garotos com a mesma condição genética que se surpreendiam e queriam saber como ele havia aprendido o ofício.

"Basta ter alguém que os ensine", explicava a mãe, a fotógrafa Sandra Reis. "E você poderia ensinar para meu filho também?" A frase soava mais como um pedido do que como uma pergunta.

Fotógrafa de espetáculos de dança, Sandra se ausentava na maioria dos finais de semana para trabalhar, aumentando o isolamento imposto a Felipe. "Ele foi criado na 'utopia da inclusão': escola regular, academia de judô regular, mas nas festas não havia convites para 'diferentes' como ele", afirma.

Ela então decidiu ensiná-lo a fotografar, para que fosse com ela aos eventos. Em 2014, após as primeiras saídas da dupla, uma fila de interessados começou a se formar.

O estúdio em sua própria casa começou a ser usado para ensinar outros jovens com deficiência intelectual. Com sede no bairro de Santana, em São Paulo, o projeto foi batizado de "Galera do Click".


Para ensinar técnicas de enquadramento, iluminação e foco, ela criou um calendário artístico no qual os alunos se revezam e atuam tanto como modelos para os colegas quanto como fotógrafos.

A publicação, chamada "O que é especial merece ser fotografado", foi lançada em 2014, com os 20 alunos integrantes da primeira turma.
O grupo cresceu e atualmente eles são 70, a maioria com Down –mas não todos eles.Sandra trabalha de forma voluntária no projeto. 

As famílias dos alunos, que podem, colaboram com R$ 30 ao mês, dinheiro usado em despesas de limpeza do estúdio e manutenção dos equipamentos fotográficos.

A conta, no entanto, não fecha. Sandra diz que precisa de mais espaço, banheiros e monitores para poder manter o projeto. "Cheguei num ponto que não dá mais para continuar improvisando".

A professora acaba de criar uma ONG para tentar captar recursos para manter o projeto em funcionamento. "Se não der resultado até o final do ano, vamos entregar o Calendário 2018 e encerrar."
Decidida a fazer o projeto vingar, ela promove ainda bazares e eventos beneficentes.

DESCOBERTA

Guilherme Augusto Bueno, 27, tem uma síndrome semelhante a de Prader-Willi, ligada à obesidade, memória curta e dificuldade de aprendizagem. Com uma rotina restrita à família até os 24 anos, sua vida começou a mudar quando, em 2015, sua mãe descobriu a Galera do Click.

"Além de mais responsável e organizado, ele se tornou o fotógrafo oficial das festas familiares. Trabalha super bem e faz questão de cobrar cachê", brinca Ana Maria. "Me sinto fotógrafo mesmo", rebate Guilherme.

Também em 2015, Tatiana Pena, 31, foi para a Galera levada pela mãe Sueli. O plano era fazer a filha se sentir mais "igual". "Gosto da forma como as pessoas me olham quando estou fotografando. Me sinto importante quando vou com a [equipe da] Galera clicar em museus, festas, eventos. São coisas novas sempre", diz Tatiana.

Paulão, 31, chegou há dois anos. "Ele já tira fotos incríveis", diz a mãe, Hedila Gióvedi. "Não se intimida, pede licença para as pessoas e já vai fotografando, filmando, e tem um olhar apurado para alguns detalhes que nem notamos".
Paulão tem sido contratado para fotografar festas de aniversário e tem planos bem focados: "Quero ganhar reais e dólares com a fotografia, casar com a Carol, minha namorada, e ter muitos filhos". 


Fotos: Karime Xavier/Folhapress




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